Neste mês de março, que marca o Dia Internacional da Mulher (8M), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (DIEESE), tem publicado uma série de levantamentos que permitem melhor compreender a realidade das trabalhadoras brasileiras. Segundo dados obtidos através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua), em 2022, o Brasil contava com 89,6 milhões de mulheres com 14 anos ou mais, sendo que 47,9 milhões integravam a força de trabalho do país.
Isto quer dizer que, aproximadamente 42 milhões estavam fora do mercado de trabalho no último ano. Ainda, de acordo com a investigação, entre as mulheres a procura de emprego, a maioria é negra (3,4 milhões). Em segundo lugar, estão mulheres brancas: 1,8 milhão buscam uma oportunidade. Ou seja, mulheres negras são quase o dobro do número de desempregadas.
Já mulheres desalentadas, ou seja, que gostariam de trabalhar, mas desistiram de procurar uma vaga porque acham que não vão encontrar, chegam a 2,3 milhões. A maior parte é de mulheres negras (1,6 milhão) enquanto brancas representam 672 mil. Observamos, portanto, que 69% da força de trabalho feminina inativa e sem perspectiva no país, é constituída por mulheres negras.
Proteção social e direitos trabalhistas
Entre as mulheres ocupadas, 65% contribuíam com a Previdência Social. Quase metade (48%) possuíam carteira de trabalho assinada. Já na condição de informais, sem vínculo empregatício regulado e, portanto, sem acesso à direitos resguardados pela legislação trabalhista, estavam 20,7 milhões (43%).
Entre a taxa de subocupação, ou seja, proporção de trabalhadores que possuem jornadas com menos de 40 horas semanais e desejam ampliá-las, mulheres também são maioria (7,8%), homens são (5,1%).
Elas ganham menos do que eles
O estudo demonstra também que o rendimento médio das mulheres ocupadas, no último ano, era 21% menor do que o dos homens. Enquanto eles, ganhavam R$ 2.909, elas recebiam R$ 2.305. São R$ 604 a menos no bolso das trabalhadoras brasileiras.
A desigualdade perpassa diferentes setores. Por exemplo, nos serviços domésticos, as mulheres representavam 91% dos ocupados e ganhavam 20% menos do que os homens. Nos campos da saúde, educação e serviços sociais, elas eram 75% da força de trabalho e recebiam 32% menos.
Em segmentos que são minoria, a diferença salarial também foi constatada. Na agropecuária, mulheres eram 19% do contingente de trabalhadores, com remuneração 21% inferior aos funcionários do sexo masculino. Também na indústria e construção, elas eram 23% das ocupadas com salários 17% mais baixos.
Porém, cerca de 20,7 milhões das mulheres inseridas no mercado de trabalho (43%) ganhavam até um salário-mínimo. O número é o mesmo da parcela de mulheres sobrevivendo na informalidade. Segundo o economista Rafael Araújo, a insegurança representa um interesse para segmentos de empregadores, pois nesta condição, os recursos gastos com a força de trabalho são mais baratos.
“O trabalho informal tende a ser menos oneroso, o contratante não possui responsabilidades como a contribuição previdenciária ou auxílio transporte, por exemplo. Além disso, com o crescimento do desemprego, muitas pessoas têm sido submetidas a esta organização de trabalho, mesmo que extremamente precarizada, porque necessitam sobreviver”, avalia.
Entre as mulheres sem contrato de trabalho formal, a maioria também é negra (52%). Segundo a antropóloga Thaís Oliveira, a persistência das desigualdades intragênero, ou seja, entre mulheres, ressalta a necessidade dos feminismos negros cuja atenção é voltada, especificamente, para a realidade das mulheres negras, considerando as múltiplas opressões as quais estão submetidas.
“Não se trata de criar hierarquizações, mas desenvolver um olhar mais aprofundado e cuidadoso sobre as condições de vida das mulheres negras que são ainda mais vulnerabilizadas do que as brancas, seja nos índices de violência, inserção no mercado de trabalho, meios de comunicação, espaço no qual ainda são minoria e quando aparecem são estigmatizadas, majoritariamente, em papeis de subalternidade, com menor prestígio social. Há uma exploração do corpo da mulher negra que é abordado de maneira hipersexualizada”, explica a pesquisadora.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.