O fato de ser mulher leva a um aumento de 11 horas por semana no trabalho doméstico e de cuidados não remunerado
Estudo intitulado “Gênero é o que importa: determinantes do trabalho doméstico não remunerado no Brasil” realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e publicado no início deste mês, evidencia que no Brasil, as mulheres desempenham uma carga maior de trabalho doméstico e de cuidados não remunerados em comparação aos homens.
Embora este resultado já tenha sido alertado por outras pesquisas, a investigação traz novos dados para o entendimento da reprodução das desigualdades de gênero no país. De acordo com o levantamento, mulheres dedicam, em média, 11 horas semanais a mais do que homens aos afazeres domésticos e cuidado com terceiros como filhos e demais dependentes.
O número revela um acréscimo em relação ao índice identificado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano passado. De acordo com o órgão, em 2022, mulheres destinavam 9,6 horas a mais do que homens a tarefas domésticas por semana.
Ainda, segundo o estudo, o impacto de crianças pequenas nas jornadas reprodutivas das mulheres é o dobro em comparação aos homens. No entanto, a presença de filhos adolescentes (de 15 a 18 anos) diminui a carga de trabalho dos pais. No entanto, existe um recorte de gênero: filhos de ambos os sexos reduzem o tempo gasto pelos pais, mas apenas filhas adolescentes contribuem para a redução do tempo dedicado pelas mães para manutenção do ambiente doméstico.
A antropóloga Rosane Lacerda indica que a desigualdade não é uma especificidade do Brasil. De acordo com ela, atividades domésticas e de cuidado são historicamente atribuídas às mulheres. “Embora a participação da mulher no mercado de trabalho tenha crescido, ainda temos a compreensão de que ela é a principal responsável pela organização do ambiente privado, doméstico. Esta noção está assentada no ideal hegemônico de feminilidade que associa à mulher ao cuidado de espaços e pessoas. Na prática, o que acontece é que mulheres são submetidas a ainda mais sobrecarga de trabalho”, diz.
A presença de idosos com 80 anos ou mais de idade afeta de maneira diferente mulheres e homens, aumentando a carga de trabalho reprodutivo delas. Ao todo, mulheres destinam cerca de 3,5 horas a mais por semana à assistência.
Outra informação importante trazida pesquisa é que os papeis de gênero impactam mais do que a renda na distribuição das atividades domésticas e de cuidado. Quando uma mulher ganha mais no trabalho remunerado, ela tende a dedicar mais tempo às tarefas domésticas. Por outro lado, homens que contribuem com menos renda do que suas parceiras tendem a reduzir sua participação nas tarefas domésticas.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.