Comitiva visitou territórios indígenas nos três estados da região Sul do Brasil
A primeira Caravana das Originárias da Terra percorreu comunidades indígenas do Sul do Brasil, entre os dias 18 e 25 de agosto, em territórios dos três estados da região. A caravana é promovida pela Articulação das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e visitou os territórios do Tekoha Y’hovy (PR), Terra Indígena Morro dos Cavalos (SC) e Por Fi Ga (RS).
Conforme a assessoria do Conselho de Missão entre Povos Indígenas (Comin), que apoiou a realização da Caravana, a atividade reuniu mais de 200 mulheres indígenas, somando as visitas nas três regiões, sendo importante para debater, principalmente, o tema da violência.
“Não só o tema da violência doméstica, mas também os temas das violações de direitos e do racismo estrutural que nós temos presente na nossa sociedade. Ouvir as mulheres indígenas sobre o que elas pensam é muito importante pra que a gente possa incidir nos órgãos de estado pra pensar políticas públicas com as mulheres indígenas”, disse Jozileia Kaingang, co-fundadora da Anmiga e assessora de projetos do Comin.
Segundo Jozileia, essas articulações fazem a diferença na vida dessas mulheres, pois elas atuam conjuntamente no esforço de tornar seus territórios seguros, mas também no combate às emergências climáticas e na construção de uma sociobioeconomia.
“Foi muito importante ouvir todas as mulheres e fortalecê-las também, assim como elas fortalecem a Anmiga”, concluiu Joziléia.
Encontro para ficar na história
Segundo Sueli Khey Tomás, liderança Kaingang da Terra Indígena Por Fi Ga, de São Leopoldo, foi uma surpresa receber tantas mulheres indígenas. O encontro na comunidade aconteceu na quinta-feira (25).
“Vai ficar pra história, a gente nunca pensou que fosse ter o estado todo na nossa aldeia, receber as outras comunidades que têm demandas totalmente diferentes das nossas e também ao mesmo tempo tão parecidas. Pra nós foi um momento histórico e a gente espera poder trazer elas de novo pra cá, porque a gente tem esse pensamento de continuar, de não parar”, afirmou Sueli.
Ela acredita que esses momentos de encontro resultam em um fortalecimento para atingir os objetivos comuns. Diante da leitura de seus relatos, percebe-se que, entre as mulheres indígenas, é comum que se refiram umas às outras como “parentas”, de outras etnias, mas que formam um único grande povo.
A Caravana das Originárias também foi organizada em outros biomas. Segundo Puyr Tembé, integrante da coordenação da caravana, visitar a região de resquícios de Mata Atlântica é um choque de realidades e territórios diferentes. Contudo, afirma que a luta é igual.
“A luta é pela garantia da nossa sobrevivência, é pela garantia de espaços, é pela garantia da vida. Saímos com mulheres cada vez mais esclarecidas, cada vez mais potencializadas de todo o conhecimento, de toda essa troca que tivemos com a caravana, trazendo as vozes de outras mulheres, de outros biomas, mas também ouvindo esse bioma que tanto sofre descaso, com falta de políticas públicas e com a violação de direitos, e também com a violação das mulheres indígenas. Eu saio daqui com essa energia, com essa responsabilidade de seguir reflorestando as mentes para a cura da terra”, relata a coordenadora.
Visita nos outros estado gerou bastante entusiasmo
Segundo a organização da caravana, cerca de 200 mulheres se reuniram no Paraná e 120 em Santa Catarina. Para Gilza Kaingang, da Terra Indígena São Jerônimo da Serra (PR), o encontro no território paranaense foi inédito.
“Foi a primeira vez que nós, mulheres do Paraná, conseguimos nos reunir para colocar as nossas demandas, as nossas inquietações. Muitas vezes, dentro das nossas comunidades nós não temos essa força na voz para chegar nas lideranças, pois a maioria das lideranças são homens. Então como nós, mulheres, chegamos nesses homens e colocamos as nossas demandas? Ter um espaço como a caravana, um encontro como esse é a oportunidade”, relatou Gilza.
Para ela, os relatos ouvidos durante o encontro mostram o quanto as mulheres necessitam de políticas públicas específicas, que muitas vezes não são consideradas pelas lideranças masculinas.
No mesmo sentido, Braulina Baniwa, mestranda em Antropologia Social na UnB e integrante da Anmiga, afirmou que foi uma grande satisfação ser recebida na TI Morro dos Cavalos, em SC.
“É emocionante, nunca imaginei que iria conhecer tantos territórios de parentes. É um ano cheio de desafios, para podermos chegar nos territórios, mas ao mesmo é uma alegria poder encontrar a força da ancestralidade que é carregada por todas nós”, disse.
Ainda segundo Paulina Martines, liderança Avá-Guarani da comunidade Tekoha Y’hovy, um dos principais motivos dos encontros foi o fortalecimento do movimento das mulheres pela terra, pela resistência e pelo reflorestamento, principalmente das mentes dos povos e dos não indígenas.
“Os encontros trouxeram essa importância de diálogo entre as mulheres indígenas em busca de um caminho melhor, um caminho em que possamos juntas conquistar nossos direitos enquanto mulheres”, afirmou. Segundo ela, as mulheres indígenas estão caminhando juntas nessa direção, “para que a gente possa realmente buscar mudanças porque a preocupação não é só pelo nosso povo, mas pelo futuro do planeta Terra”.
Fonte: Brasil de Fato