Neste ano, estão vigentes oito contratos que, juntos, passam de R$ 21,6 milhões
Levantamento realizado pela APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná) identificou que, neste ano, a quantidade de recursos públicos destinados pela SEED (Secretaria Estadual de Educação) à contratação de consultorias privadas sem licitação aumentou 541%.
Em 2023, foram firmadas seis contratações, totalizando R$ 3,3 milhões. Já neste ano, estão vigentes oito contratos que, juntos, passam de R$ 21,6 milhões em gastos com consultorias.
Para Marlei Fernandes, secretária de Assuntos Jurídicos da APP-Sindicato e vice-presidenta da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), a explosão de contratações de empresas particulares para cumprir funções que deveriam ser executadas pelo estado, reforça o caráter privatista que o governador, Ratinho Júnior (PSD), tem adotado.
“A APP-Sindicato reitera que é um governo que abre mão de tudo que é público, dos seus instrumentos próprios de fiscalização e mesmo do trabalho do dia a dia da escola para a contratação de grandes corporações. Nós entendemos que esse processo é muito ruim para a educação pública paranaense, via de regra, são empresas que não entendem do bem público”, avalia.
Contrato milionário e perseguição
Um dos contratos destacados pela APP, foi firmado em maio último pela SEED e a Fundação Getúlio Vargas, com o objetivo de fornecer assessoria técnica especializada aos Núcleos Regionais de Educação. Porém, segundo a entidade, na prática, a finalidade “é fortalecer a política de pressão, exigências absurdas e perseguição nas escolas”.
“A gente vive hoje uma metodologia de perseguição nas escolas públicas do estado Paraná, e mais uma vez, nós denunciamos que o crescimento da contratação de diversas empresas, tem sido para a obtenção de dados e com isso fazer com que as escolas sejam ainda mais monitoradas, os profissionais da educação também. Isso não tem levado ao crescimento positivo, muito pelo contrário, tem levado ao adoecimento e ao gasto público exagerado com essas empresas”, adverte a liderança.
O contrato com prazo inicial de 12 meses e gasto estimado em R$ 16,5 milhões, visa a admissão de pelo menos um tutor para cada Núcleo Regional de Educação. Entretanto, segundo relatos da categoria, onde as consultorias já se apresentaram, as cobranças têm sido pelo cumprimento de metas inatingíveis a fim de alavancar o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica).
“Em 2024, nós estamos batendo o valor de R$ 21,6 milhões dos quais R$ 16,5 milhões são para a Fundação Getúlio Vargas. Isso implica a contratação de consultoria técnica, como eles dizem, para os Núcleos Regionais de Educação, ou seja, eles estão contratando uma pessoa de fora que vai ter um alto salário e que vai ajudar o chefe de Núcleo a monitorar ainda mais as escolas”, reforça.
Com base em dados do Ministério da Educação, divulgados em agosto, o Paraná foi destaque na edição do IDEB 2023. Entre 2021 e 2023, o estado aumentou de 4,8 para 4,9 a sua nota geral, mantendo a liderança nacional. A média brasileira é de 4,3.
Mas, conforme alertado pela APP, “o custo do IDEB tem sido a saúde mental dos educadores” submetidos a jornada cada vez mais extenuantes, assédios, crescente plataformização do ensino cerceando a autonomia docente.
Realidade escolar ignorada
Fernandes cita o caso de Cascavel, na região Oeste do estado. Segundo ela, em reuniões com diretores e a chefia no Núcleo, as demandas apresentadas pelas comunidades escolares foram ignoradas.
“A consultoria só está cobrando, mais notas, mais frequência, mas não trabalha de forma alguma as necessidades que esta comunidade escolar tem, os pedidos que os diretores já fizeram, para aumentar o número de trabalhadores, entre outras melhorias nas escolas, isso é completamente ignorado. Nós entendemos que mais essa contratação de mais uma fundação vem com o histórico do que o governo já vem fazendo, ou seja, monitorar mais as escolas e tentar ranqueamento”, assinala.
“Não dialoga com a realidade escolar, não dialoga com as necessidades que as escolas públicas têm e isso nós da APP já estamos fazendo a denúncia há alguns anos, mas é um projeto de governo. O projeto de governo Ratinho Júnior é entregar tudo para a iniciativa privada. Vejam que R$ 3,3 milhões em um ano, mais R$ 21 milhões em outro, nós já teríamos aproximadamente R$ 25 milhões que poderiam ser investidos nas mesmas escolas pelo próprio governo, mas infelizmente isso não acontece”, complementa.
Ainda, a APP tem questionado as contratações milionárias ao passo que, até o momento, direitos dos servidores como o pagamento da data-base ainda não foram concedidos.
O Sindicato informou que irá protocolar denúncia junto ao Ministério Público do Paraná e solicitar abertura de investigação pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.