Indígenas Ava Guarani enfrentam nova onda de ataques em Guaíra e Terra Roxa, enquanto retomam terras
Retomadas e aldeias dos povos Ava Guarani sofreram, novamente, uma sequência de ataques entre o final de sexta-feira (19) e a madrugada e o decorrer do sábado (20). As ofensivas, promovidas por fazendeiros da região Oeste do Paraná, nos municípios de Guaíra e Terra Roxa, são contra ocupações realizadas por indígenas desde o dia 05/07.
No início de julho, os guaranis começaram um movimento de expansão das aldeias e também de retomada de áreas dentro da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, que foi delimitada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em 2018, após longo processo de luta e muitas reivindicações. A reserva fica nos municípios de Guaíra, Terra Roxa e Altônia e vários trechos dela estão hoje em fazendas da região. São 165 os produtores rurais dos municípios de Guaíra e Terra Roxa que têm trechos de terra na Reserva Indígena. As propriedades somam cerca de 24 mil hectares.
Desde então, fazendeiros da região têm promovidos ataques aos indígenas em diversos locais. Tiros foram disparados, acampamentos incendiados e guaranis foram atropelados.
A tensão levou a Força Nacional de Segurança à região. Mesmo assim, diversas retomadas foram alvo de ataques e ameaças no último final de semana.
Na tarde de sábado, aconteceram cercos de homens armados e também incêndios criminosos em florestas onde estão acampadas famílias Guaranis.
Na sexta, ao menos quatro retomadas receberam notificação de reintegração de posse expedida pela 2ª Vara da Justiça Federal do município de Umuarama. A ordem de reintegração, assinada pelo Juiz João Paulo Nery dos Passos Martins, dá aos indígenas o prazo de dez dias para desocupar as áreas.
Mas os guaranis não pretendem abandonar as retomadas e dizem que vão resistir. “Esse juiz que determinou essa reintegração não conhece nossa cultura, nosso modo de vida. Ele que mande matar todos nós, que é mais fácil, porque a gente não vai sair daqui, melhor morrer aqui mesmo, que assim nossos filhos vão enterrar a gente aqui, na nossa terra”, enfatiza o Cacique Izaías.
“Passar por cima da polícia”
Nos últimos dias, os Guaranis tiveram também acesso a mensagens que teriam sido compartilhadas por fazendeiros em grupos de whatsapp. Nelas, os ruralistas estariam convocando ataques às retomadas e dizendo que se preciso for vão “passar por cima da polícia” para retirar os indígenas das terras.
O Parágrafo 2 teve acesso a dois vídeos que estariam circulando nestes grupos. Um deles tem imagens aéreas das retomadas e no outro uma mulher, não identificada, convoca agricultores de outros municípios para expulsar os indígenas.
“Pessoal de Mundo Novo e Eldorado, estamos aqui em Guaíra com três invasões de propriedade hoje. Uma aqui no Mirante da Eletrosul, bem próxima da rotatória, outra lá na estrada do Picadão e outra na Pedreira. A gente precisa de ajuda de vocês, de reforço… precisamos juntar gente aqui e arrancar esse povo hoje daqui”, diz a mulher enquanto grava uma das retomadas.
As Terras Indígenas do Oeste do Paraná e sua demarcação
As Terras Indígenas da região Oeste do Paraná são uma parte do território tradicionalmente ocupado pelos Avá-Guarani que não foi submersa pelo reservatório da Usina Hidrelétrica de Itaipu.
Os guaranis foram expulsos durante a ditadura para que a usina pudesse ser construída. Terras da comunidade e áreas consideradas sagradas, como a cachoeira de Sete Quedas e cemitérios, foram alagadas para a instalação da megaobra. Grande parte dos territórios indígenas foi inundado.
O que não foi alagado, no entanto, foi convertido, em grande medida, em lavouras para a produção de commodities agrícolas. Segundo a Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) – que é uma organização indígena que congrega coletivos do povo Guarani nas regiões Sul e Sudeste do Brasil – nenhuma dessas terras teve seu processo de reconhecimento pelo Estado concluído até hoje, “o que tem perpetuado a situação de extrema vulnerabilidade e violação de direitos humanos e territoriais que recaem sobre as comunidades. Nesse contexto, a região é marcada por graves conflitos sociais atrelados ao litígio territorial envolvendo as comunidades Avá-Guarani e setores de interesses políticos e econômicos contrários aos direitos originários dos povos indígenas sobre as suas terras, com destaque para o setor ruralista”.
Fonte: Brasil de Fato / Parágrafo 2