Valor é o mesmo do lucro esperado com venda das ações e inclui despesas como PDV e renovação de outorga
A privatização da Copel, agora questionada no Supremo Tribunal Federal (STF), já custou pelo menos R$ 4 bilhões – equivalente ao máximo que o Paraná espera arrecadar com a venda de suas ações. O valor é referente à soma dos contratos de serviços relacionados ao trâmite publicados pela companhia no Portal da Transparência e inclui, ainda, a reserva de 300 milhões para o Programa de Demissão Voluntária (PDV) aprovado em acordo com os servidores e os R$ 3,7 bilhões pagos para renovar antecipadamente a outorga de suas principais usinas em decisão justificada pela própria mudança no modelo da companhia.
Fontes ouvidas pelo Plural, no entanto, sugerem que não é possível chegar ao valor de fato dos custos, considerando a confidencialidade adotada pela empresa em muitos dos atos praticados no âmbito do processo. A contratação recente do sindicato das instituições financeiras para coordenar a privatização, por exemplo, não teve os custos divulgados. O acordo envolve nomes grandes do mercado – como os bancos Itaú, Bradesco e BTG Pactual –, o que sugeriria empenhos de ordem bastante considerável.
Mas entre os valores tornados públicos até agora, a renovação da outorga das usinas Salto Caxias, Foz do Areia e Segredo segue sendo a fatia mais representativa dos gastos.
Copel
A Copel pagou R$ 3,7 bilhões para se manter responsável pelas hidrelétricas que formam o conjunto mais atrativo da geração, responsável por aproximadamente 70% de toda a capacidade instalada da elétrica paranaense. Ainda que o vencimento de uma delas (Foz do Areia) só estivesse previsto para 2024, e as demais para 2032 e 2033, a direção da empresa comunicou ainda em dezembro do ano passado a intenção de antecipar a renovação para manter o controle sobre as plantas mesmo após a privatização.
Se o rito seguir o cronograma ideal da gestão Ratinho Jr., as ações devem ir à leilão em outubro. A decisão vai reduzir de 31,1% para no máximo 15% o capital total do Paraná sobre a Copel, além de encolher de 69,7% para 10% a participação do governo nas ações ordinárias da estatal, aquelas que garantem direito a voto nas assembleias.
A expectativa inicial é de obter R$ 3 bilhões com a venda, menos da metade do lucro total obtido pela companhia em 2022, ainda que também seja possível que a arrecadação chegue aos R$ 4 bilhões. Para isso, a própria Copel vem se mostrando empenhada em tornar tudo mais fácil para a futura transição.
Mercado
Parte desse processo, a decisão de entregar ao mercado uma empresa mais enxuta deve custar pelo menos R$ 300 milhões ao governo. A elétrica se comprometeu a lançar ainda em 2023 um novo programa de demissão com desligamentos que devem ocorrer um ano após a migração para o modelo sem acionista controlador. No quarto ano após a privatização, e com outros PDVs consecutivos, a companhia espera chegar a um quadro de servidores 10% menor do que o atual.
Trechos do ofício de anúncio do PDV são claros ao estabelecer que as medidas do programa estão condicionadas “à transformação da companhia em corporação”, trâmite por trás do qual também está uma série de contratos já assinados pela Copel, alguns em montantes milionários.
Assessorias
No primeiro comunicado feito ao mercado em 2023, a estatal anunciou a contratação de assessorias especializadas para trabalhar na estruturação da oferta das ações. Entre 3 e 28 de fevereiro, com o objeto “contratação de assessoria”, foram publicados contratos com os escritórios Stocche, Forbes, Padis, Filizzola e Clapis (R$ 4,1 milhão); Ernst & Young (R$ 7 milhões); PSR Soluções (R$ 256,4 mil) e com os bancos Genial (R$ 6,99 milhões) e BTG Pactual (R$ 10 milhões). Os documentos estão sob confidencialidade. Também confidencial é um acordo com o banco Banco Credit Agricole Brasil, de R$ 2,2 milhões, para assessoria financeira.
Contratos públicos são os de valores mais “modestos”. Entram na lista R$ 1,02 milhão para avaliação dos bens da Copel – que embora não explícitos como sendo para mudança, são parte essencial do processo; R$ 45 mil à Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital para “capacitação profissional em corporate venture capital”; R$ 67 mil para a “Copel Day”, evento virtual organizado também para apresentar informações sobre a mudança; e outros R$ 36 mil ao BTG Pactual para atuar como formador de mercado das ações da companhia na B3.
A Copel não se pronunciou especificamente sobre o valor somado dos contratos mostrados pela reportagem.
Custos
Em relação aos custos dos acordos com o sindicato das instituições financeiras para coordenar a privatização, que não foram divulgados, a empresa disse que “está condicionado, para efeito de remuneração, aos serviços efetivamente prestados associados à potencial oferta pública ao mercado – primária (Copel) e secundária (Estado do Paraná)”, sob fiscalização do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR).
E sobre a confidencialidade que abrange outros contratos, disse que “podem conter informações relativas à atividade empresarial da companhia cuja divulgação pode representar vantagem competitiva a outros agentes econômicos, em proteção ao contido no artigo 27-D da Lei nº 6.385/1976”, além de poderem ainda estar relacionados a “informações capazes de embasar decisões de política econômica do Estado do Paraná”. “Diante disso, nos termos do Art. 30, III c/c o Art. 35 do Decreto nº 10.285, de 25 de fevereiro de 2014, conforme competência conferida pela Art. 30, III do mesmo Decreto, informa-se que foi conferido grau reservado às informações contidas nos referidos contratos que, não obstante, são fiscalizados pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR)”, afirmou, em nota.
STF e BNDES
Apesar de dada como certa, a privatização da Copel tem enfrentado resistência da oposição a Ratinho Jr. Na última sexta-feira (30), o Partido dos Trabalhadores (PT) entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF questionando a legalidade da lei aprovada na Assembleia Legislativa (Alep) que abriu caminho para que o governo do Paraná saia do controle da empresa.
O partido busca que a Corte reconheça vícios no trâmite da iniciativa no legislativo paranaense, conduzido em regime de urgência e sem audiências públicas de fato.
“As manobras empregadas durante a aprovação da Lei 21.272, de 24 de Novembro de 2022 são evidentes. A exclusão da sociedade do poder de decisão – plebiscito – sobre a desestatização da COPEL ao passo que não houve efetivo debate legislativo a respeito do tema, caracteriza, sem sombra de dúvida, o desvio de poder/finalidade uma vez que houve a prática de ato ilícito atípico, qual seja: afastar a competência exclusiva do Poder legislativo em fixar o procedimento e regras para a desestatização da COPEL”, diz trecho da ação, distribuída ao ministro Luiz Fux, presidente da Corte.
União
A peça pede ainda ao STF que considere interferência da Copel em propriedade da União. Isso porque o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) detém 24% do capital social da companhia, o que, para o PT, estaria ocorrendo “flagrante violação ao pacto federativo” com a “redução injustificada dos direitos políticos da União sobre a empresa a ser desestatizada”.
Na sexta, o BNDES se posicionou sobre a privatização da elétrica paranaense após dois representantes da instituição que integram o conselho da empresa terem acenado a favor da venda das ações. “O posicionamento da BNDESPAR será oportunamente formalizado nas assembleias convocadas pela Copel”, diz a nota. “Tal posicionamento, a ser oportunamente registrado, levará em consideração a natureza estratégica da Companhia e o seu relevante papel para segurança energética do Brasil, bem como assegurará os direitos e interesses do BNDES como banco público, que financia e participa da empresa há 30 anos”.
Fonte: Jornal Plural