Por iniciativa do deputado Renato Freitas, o evento debateu também a efetivação da Lei federal nº 10.639/2003 nas escola
Matéria: Ana Carolina Caldas/Brasil de Fato Paraná
Um estudo realizado pelo Instituto de Referência Negra Peregum (IPEC) em parceria com o Projeto Seta revelou que 64% dos jovens consideram o ambiente escolar como o local em que mais sofrem racismo. Esta pauta foi debatida na Assembleia Legislativa, nessa segunda feira, dia 20, Dia da Consciência Negra, na Audiência Pública “Combate ao Racismo na Educação: 20 anos da Lei 10.639/2003”. O evento, de iniciativa do deputado estadual Renato Freitas (PT), reuniu professores, pesquisadoras, estudantes, movimentos sociais, sindicatos e entidades que debateram, entre vários temas relacionados, a importância para o combate ao racismo da efetivação da Lei que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”.
Participaram, além do deputado Renato Freitas, também a vereadora Giorgia Prates (PT), o deputado estadual Professor Lemos (PT), o deputado federal Tadeu Veneri (PT), a diretora de Igualdade Racial, Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais do Governo do Paraná, Clemilda Santiago, a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UEL, professora Dra Marleide Rodrigues da Silva Perrude, a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFPR, a professora Dra Megg Rayara Gomes, a pro reitora de assuntos estudantis da UEPG, Ione da Silva, a pesquisadora do IPAD BRASIL, Tânia Lopes, a coordenadora interina do Movimento Unificado Negro, a professora Almira Maciel, coordenadora do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais Curitiba (SISMUC), Juliana de Fátima Mildemberg de Lara, o diretor do Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Curitiba (SISMMAC), Sandro Luiz Fernandes, a secretária de Combate ao Racismo da APP, Celina Santiago e a estudante do ensino médio do Colégio Estadual João Paulo I, Isabela Cauane Nascimento Machado.
Renato Freitas, ao iniciar a Audiência, relembrou sua vida enquanto jovem e a ausência de referências negras tanto na mídia como na escola e destacou que a escola acaba expulsando os alunos negros e que essa realidade precisa mudar.
“Eu, Renato Freitas, fui uma criança que ligava a televisão e via o show da Xuxa e as paquitas louras. Mudava o canal e encontrava a Eliana, com a dança dos dedinhos. Cansado disso, eu mudava o canal e via a Angélica, indo de táxi. Quando mais velho, vi pela primeira vez um cinema e vi o Titanic, com a Rose e o Jack, exemplares da beleza europeia, do protagonismo europeu. E depois, com o tempo, eu descobri que a mídia e o cinema eram todos de propriedade de pessoas brancas, europeias ou descendentes de europeus. Nós nos informávamos, nós ainda nos informamos e informamos as nossas crianças pelo olhar europeu brancas,” disse.
Freitas destacou a importância de se fazer este debate no dia 20 de novembro. “Hoje é um dia que remonta a 20 de novembro de 1695, em que a nossa maior liderança, maior inspiração, Zumbi dos Palmares, foi assassinado, perdeu a vida, pela justiça, pela igualdade e pela liberdade. E hoje nós, de forma tímida, de acordo com as forças que temos aqui na Instituição, promovemos essa audiência pública também para lutar, para que haja uma educação que nos veja como seres humanos e que também conte a nossa história. Para que amanhã ou depois, essa nova geração de crianças negras sejam autores, autoras de livros, professores, cineastas, que estejam envolvidos, inclusive, nos meios de comunicação, para melhor informar os nossos feitos”, disse.
Por iniciativa do deputado Renato Freitas, o evento debateu também a efetivação da Lei federal nº 10.639/2003 nas escolas do Paraná / Ana Caldas
É preciso mudar a formação de professores
Entre as pesquisadoras convidadas para trazerem reflexões sobre a temática da audiência, foi unânime a importância e urgência de se investir e mudar a formação inicial dos professores. Para a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFPR, a professora Dra Megg Rayara Gomes, a universidade ainda é guiada pelo pensamento do homem branco, cis, hetero que acaba por ser predominantes.
“Como professora universitária, trabalhando numa universidade branco centrada, onde o homem branco, cis, hétero, impõe uma narrativa e ignoram outros saberes, não significa que nós, professores pretos e pretas, não estejamos fazendo as nossas pesquisas. Cotas são importantes para mudar a configuração de uma instituição como a Universidade Federal do Paraná, mas é fundamental que a gente reveja as nossas epistemologias que são colocadas em cada disciplina, porque é responsabilidade de cada professor, de cada professora fazer esse debate,” diz.
Na mesma linha, a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UEL, professora Dra Marleide Rodrigues da Silva Perrude, reiterou a importância de se rever a formação de professores. “É urgente cobrar das universidades sobre a formação inicial de professores, não somente a inserção da História e Cultura Afro-brasileira em seus currículos, mas a sua implementação e implantação de fato na prática nas horas de aula. Os currículos de formação de professores ainda são marcados pelo silenciamento, pelas ausências desse debate mais ampliado no espaço da universidade, destacou a coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UEL, professora Dra Marleide Rodrigues da Silva Perrude.
Já a pesquisadora do IPAD Brasil, Tania Lopes, citou sua pesquisa sobre o racismo e a falta de interesse do governo do Paraná em identificar casos de racismo nas escolas. “Minha pesquisa voltou-se sobre como se dão as práticas racistas no espaço escolar das escolas estaduais do Paraná em diálogo com as diretrizes curriculares nacionais de educação. Pedi para a Secretaria informações sobre casos de racismo em 2016, essa solicitação foi para a Coordenadoria Geral do Estado, que em 2017 me respondeu que não teriam essas denúncias categorizadas. Ou seja, se o estado não reconhece, se o estado não conhece as práticas racistas, é um estado que não está preocupado com as violências sofridas,” disse.
Presente na audiência, a diretora de Igualdade Racial, Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais do Governo do Paraná, Clemilda Santiago, citou que a Secretaria da Mulher e Igualdade Racial tem trabalhado para mudar esse cenário na estrutura do estado. “Eu vejo nesse momento uma oportunidade de trabalho em prol da nossa população, em prol da nossa vida, em prol da nossa família. E hoje eu tive a felicidade de estar junto com a Secretaria, lançando uma campanha contra o racismo, de combate ao racismo, que envolve toda a estrutura do Estado. Então estamos trabalhando nesse sentido para que nossa sociedade paranaense se modifique, para que a sociedade,” disse.
Por iniciativa do deputado Renato Freitas, o evento debateu também a efetivação da Lei federal nº 10.639/2003 nas escolas do Paraná / Ana Caldas
Ouvir os jovens
Tão importante quanto a formação dos professores também está a escuta junto às crianças e jovens. A pro reitora de assuntos estudantis da UEPG, Ione da Silva, contou que atualmente há na Pro Reitoria uma diretoria voltada às ações afirmativas e diversidade com este objetivo também. “Acho que é importante destacar que a Universidade Estadual de Ponta Grossa foi a primeira universidade do Estado a ter dentro de uma pró-reitoria de assuntos estudantis uma diretoria de ações afirmativas e diversidade. E, nessa diretoria, criamos um canal de escuta. Pois é preciso ouvir os alunos também para pensar as políticas publicas,” destacou.
Efetivação da Lei 10.639/2003
Promulgada em 2003 pelo presidente Lula , a Lei 10.639 passou por amplo debate junto a professores e entidades da educação na época. Mais de 20 anos, ainda ela é analisada como não efetivada na prática. A professora e coordenadora interina do Movimento Unificado Negro, Almira Maciel participou do processo de elaboração da lei e diz que ainda há muito que se fazer para vê-la implementada. “Foi um primeiro momento aquele de se levar a questão que emergia da necessidade do combate ao racismo via uma legislação destinada à educação. Contudo, esses 20 anos se passaram e nos parece que ela só é efetivada em novembro, mês da Consciência Negra,” diz.
Também fizeram falas destacando a importância da Audiência Pública e de fazer valer a Lei promulgada em 2003, a vereadora Giorgia Prates, o deputado estadual Professor Lemos, o deputado estadual Tadeu Veneri, a coordenadora do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais Curitiba (SISMUC), Juliana de Fátima Mildemberg de Lara, diretor do Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Curitiba (SISMMAC), Sandro Luiz Fernandes, a secretária de Combate ao Racismo da APP Sindicato, Celina Santiago e a estudante do ensino médio do Colégio Estadual João Paulo I, Isabela Cauane Nascimento Machado.
Vereadora Giorgia Prates (PT) / Lucas Botelho