Dando passagem para o pandeiro e purpurina, o Samba da Madrugada, evento que ocorre há uma década em Londrina, é uma das atividades que abre a folia nesta sexta-feira (9) juntamente com o primeiro desfile da Escola de Samba Explode Coração (confira a programação completa aqui).
A edição carnavalesca do Samba da Madrugada tem como atração principal roda com sambas-enredos. Composições da Mangueira, Salgueiro e Portela garantem a festa que ocorre a partir das 21h no Iate Clube (Avenida Higienópolis, nº 2.135 – Centro).
Em dezembro de 2023, após muita resistência para manter o evento, a organização comunicou através de rede social, que aquele seria o último encontro. Entre os principais desafios: a falta de apoio e dificuldades para fechar as contas, conforme explica Michael Soares, produtor e idealizador do Samba da Madrugada.
“Toda equipe já estava muito cansada, sem estímulo financeiro, somando algumas dívidas em relação à edições anteriores. Alguns problemas aconteceram no que diz respeito aos espaços que a gente trabalhava, não estávamos tendo nenhum auxílio. Nós temos uma relação muito forte com o samba que a gente traz para Londrina, de fato, o melhor que o samba permite na atualidade. Em 2022, por exemplo, a gente teve Fundo de Quintal na nossa cidade, Jorge Aragão, Leci Brandão, Sandra de Sá”, diz.
Ele pontua que, juntamente com o reconhecimento da cultura popular, outra preocupação era valor dos ingressos, que foram mantidos em preços acessíveis a fim de oportunizar a participação de todos os segmentos da população, principalmente, das camadas mais vulnerabilizadas. “Sempre pensando em um ticket barato, que consiga pagar as contas, o que na maioria das vezes não acontece, e que todos desde a classe C até a classe A consiga interagir e ir ao evento”, reforça.
Além de contribuir para a diversidade da cena cultural, o Samba da Madrugada também cooperou para geração de trabalho e renda. “Já conseguimos empregar diretamente mais de 2,5 mil pessoas e trazer públicos de outras cidades, cerca de sete municípios envolta de Londrina. É um samba que tem notoriedade, inclusive, fora de Londrina, chegando a outras regiões. Temos boas entradas, todo mundo conhece a gente em São Paulo, no Rio de Janeiro, Recife e Bahia. Falam que tem um samba no Paraná que todo mundo deve conhecer”, observa.
Os ingressos estão no último lote, mas ainda dá tempo de garantir. A entrada meia solidária (é necessário levar 1 KG de alimento) custa R$ 45. Também é possível adquirir mesa para quatro pessoas (veja mais informações no seguinte link).
Patrimônio cultural de Londrina
Neste ano, um novo motivo para esperançar. Face ao comunicado da equipe e a comoção do público que já ultrapassa 40 mil pessoas, projeto de lei, protocolado pelo vereador Fernando Madureira (PTB), institui o Samba da Madrugada como patrimônio cultural da cidade. A legislação incentivou a retomada do evento. A expectativa é que a regulamentação seja votada ainda este mês pela Câmara Municipal de Londrina.
“O projeto de lei busca trazer um pouco mais de reconhecimento e agendamento da cidade em relação ao Samba da Madrugada, enaltece, privilegia, interagindo com o calendário da cidade e com isso a gente tem uma visibilidade diferenciada. Isso ajudaria a manter o evento vivo”, observa Soares.
As rodas de samba surgiram no Brasil no século XIX, entre negros escravizados. Nas senzalas, eles realizavam batuques, cantavam e dançavam como forma de resistência e preservação da cultura.
“Falar de samba é falar de minoria. Londrina tem um status social em relação ao restante do Brasil mais elevado. Mas temos minorias aqui, muitas pessoas negras na cidade que, de fato, precisam encontrar com os seus. Samba é interagir em roda, de forma que as pessoas trocam energia, se encostam, se falam, criam um ambiente que só ali acontece. Por isso, a gente quer enaltecer e deixar perpétuo para Londrina, para enaltecer a cultura popular, a cultura preta”, finaliza.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.