Por Venâncio de Oliveira
Na minha última coluna do programa aroeira, da rádio UEL, retomei o debate sobre qualificação, educação e precarização em termos de oferta de trabalho. A atual conjuntura caótica do bolsonarismo condiciona doutores a trabalharem em serviços gerais, enquanto as universidades públicas reduzem os concursos, mesmo faltando professores. Um modelo de desqualificação geral das profissões que torna descartável o trabalho intelectual. Ele é derivado de uma inserção subordinada da economia brasileira, dado uma alta financeirização da economia. Mas qual a relação entre a especulação no mercado financeiro e um cientista trabalhando em bicos?
É preciso partir de uma análise sistêmica. Por um lado, esse modelo aposta principalmente no curtíssimo prazo. Tomo o exemplo da política da Petrobrás, onde os investimentos de longo prazo reduziram-se. O capital que é investido na empresa pública quer lucro para ontem e para isso a empresa faz todo esforço para garantir bons dividendos para os acionistas, à custa de incrementar custos e ampliar preços finais. Por outro lado, o Estado não pode utilizar esses dividendos para investir em comprar refinarias e abrir concurso público, nem para produzir política pública no repasse de recursos a outras áreas (educação, saúde, assistência social, etc). Os capitalistas não querem aumento de gastos públicos, pois é uma oferta de bens e serviços públicos a partir da demanda de força de trabalho de qualidade. Além do mais, eles se sentem ameaçados com ideia de que o governo vai aumentar impostos e controlar o câmbio, pois diminui seus ganhos.
O curto prazo exige que o capital obtenha lucro o mais rápido possível, espelhando a lógica especulativa da compra e venda de papéis, nos empréstimos e/ou ganhando à custa de alta exploração do trabalho. Nesse modelo, só vale o que dá dinheiro sem grandes investimentos, o que exige altas horas de trabalho e empregos desqualificados. Todo direito trabalhista é visto como aumento de custos e mexe com a lógica de dinheiro que faz dinheiro para anteontem. É um modelo econômico que exige alta rotação da força de trabalho, de aumento de subemprego, incremento do desemprego estrutural, que por outro lado, tem impacto nas negociações salariais das categorias sindicalizadas.
Assim, esse modelo amplia o setor de trabalho desregulado e desconstrói as qualificações. Com menor demanda de cientistas, quem vai querer investir em estudos? Um modelo alternativo passa primeiro pela importância do gasto público para geração de emprego de qualidade, evitando desperdícios das capacidades de doutores. Um cientista tem de produzir vacinas, e não cuidar de carro na rua.