Apenas, em 2021, foram registrados 2.487 óbitos
Relatório divulgado, nesta semana, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) traz mais informações sobre a organização da força de trabalho em escala global. De acordo com o documento, aproximadamente um terço dos trabalhadores, em todo o mudo, têm carga horária voltada às atividades laborais que ultrapassa 48 horas semanais, ou seja, quase dez horas por dia de segunda a sexta-feira. Por outro lado, um quinto dos trabalhadores atua em tempo parcial, com menos de 35 horas por semana.
Porém, a pesquisa alerta para a observação de que as jornadas mais curtas nem sempre são decorrentes da escolha do funcionário, mas sim reflexo do desemprego e de condições mais precarizadas de trabalho sob as quais têm aumentado o número de contratações sem vínculo formal e de vagas horistas, isto é, o trabalhador recebe de acordo com as horas dedicadas a execução de determinada função.
“Embora as longas horas de trabalho tenham diminuído ligeiramente no início da pandemia [de Covid-19] e o período mais curto de horas de trabalho tenha aumentado um pouco, ambos os fenômenos já estavam voltando aos níveis pré-pandêmicos no fim de 2020”, indica a OIT.
Outro modelo de trabalho intensificado em decorrência da crise sanitária global foi o remoto. Segundo levantamento realizado pelo jornal Valor Econômico, no Brasil, a proporção de profissionais satisfeitos com o home-office aumentou de 64% em 2020 para 73% em 2021. Além disso, 81% se consideraram igualmente produtivos ou mais em 2021. Em 2020, o índice era de 73%.
Contudo, a advogada trabalhista Bianca Peres ressalva para a necessidade de um olhar mais investigações, visto as desigualdades sociais que estruturam o mercado de trabalho a fim de não desenvolvermos compreensões equivocadas sobre as transformações no campo. “Muito tem se falado em home-office, e de fato a adesão cresceu com a necessidade de isolamento social. Porém, quem tem acesso a esta modalidade? Além das profissões classificadas como essenciais, tendencialmente, as mais precarizadas como trabalhadoras domésticas, de aplicativo, também não conseguem exercê-la”, lembra.
Para Peres, as jornadas de trabalho cada vez mais extenuantes é uma das características mais marcantes da estruturação do trabalho sob o sistema capitalista. “Uma das bases deste sistema produtivo, de acumulação de renda para os empregadores é a exploração da mão de obra. É necessário, segundo esta compreensão, que o trabalhador produza muito e por mais tempo para que gere ainda mais lucro. Porém, o aumento das mercadorias não é revertido em seu salário que permanece o mesmo, já a saúde é frequentemente afetada mediante condições cada vez mais frágeis”, avalia.
Ela indica também as consequências da Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467 de 2017) e de outras iniciativas como a Carteira Verde Amarela, criada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) que tornaram as relações de trabalho ainda mais precarizadas. Assim, de acordo com estudo da OIT em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT), no período entre 2012 e 2021, o Brasil registrou 22.954 mortes provocadas por acidentes de trabalho. Apenas em 2021, foram comunicados 571,8 mil acidentes e 2.487 óbitos associados ao trabalho, com aumento de 30% em relação a 2020. Em 2021, os maiores aumentos no número de notificações de acidentes ocorreram em Roraima (+53%), em Santa Catarina (+35%) e no Piauí (+29,9%).
Na série histórica de dez anos (2012 a 2021), grande parte dos acidentes foi causada pela operação de máquinas e equipamentos (15%). Também entre 2012 e 2021, foram registradas 6,2 milhões de Comunicações de Acidentes de Trabalho (CATs) e o INSS concedeu 2,5 milhões de benefícios previdenciários acidentários, incluindo auxílios-doença, aposentadorias por invalidez, pensões por morte e auxílios-acidente. No mesmo período, o gasto previdenciário ultrapassou os R$ 120 bilhões somente com despesas acidentárias. Contudo, os organismos estimam que os números sejam ainda maiores.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.