Escolas com alunos majoritariamente brancos possuem melhor infraestrutura
Pesquisa intitulada “A cor da infraestrutura escolar: diferenças entre escolas brancas e negras”, desenvolvida pelo Observatório Branquitude, iniciativa da sociedade civil fundada em 2022 e dedicada a produzir conhecimento sobre os impactos do racismo na reprodução das múltiplas desigualdades, identificou que, no Brasil, escolas públicas que possuem maioria de estudantes negros apresentam pior infraestrutura em comparação aos colégios que concentram a maior parte do alunado formado por brancos.
A investigação reúne dados do Censo Escolar e do INSE (Nível Socioeconômico das Escolas de Educação Básica), ambos coletados em 2021. A partir de questões como posse de bens no domicílio, contratação de serviços, renda familiar e escolaridade dos responsáveis, o INSE estabelece sete níveis de modo gradativo.
O primeiro deles, equivale ao menor nível da escala e indica que o estudante tem em sua casa bens elementares como uma televisão em cores, uma geladeira, um telefone celular, a renda familiar mensal é de até um salário-mínimo e seus pais ou responsáveis possuem ensino fundamental completo ou estão cursando esse nível de ensino.
Já no maior nível da escala, os alunos indicam que há em sua casa um quantitativo alto de bens elementares, como duas ou mais geladeiras e três ou mais televisões em cores, computador e acesso à internet, três ou mais carros, a renda familiar mensal está acima de sete salários-mínimos, seus responsáveis completaram o ensino superior e/ou podem ter concluído um curso de pós-graduação.
Com base nestas informações, o levantamento construiu duas categorias: escolas predominantemente brancas são aquelas com 60% ou mais de alunos autodeclarados brancos, já escolas majoritariamente negras são aquelas com 60% ou mais de alunos autodeclarados negros.
Segundo a investigação, “escolas brancas” detém, em sua maioria, estudantes pertencentes aos níveis socioeconômicos V e VI (88%). Já em “escolas negras” o maior quantitativo de alunos está nos níveis socioeconômicos III e IV, alcançando 75% do total. Isto quer dizer que, em média, enquanto a renda familiar dos estudantes brancos oscila entre cinco e sete salários-mínimos, entre os alunos negros, o valor fica até um salário-mínimo e meio.
Participaram do mapeamento, unidades estaduais (92,3%) e municipais (7,6%). As escolas brancas têm mais quadra de esportes (80,3%) do que as escolas negras (51,7%), mais acesso à rede de esgoto (72,2% face a 56,5%) e mais laboratórios de informática (74,6% ante a 53,1%). A presença de biblioteca em escolas brancas (55,2%) é ligeiramente maior que em escolas negras (50,2%).
De todo modo, chama atenção que apenas um pouco mais da metade das escolas públicas em todo território nacional possuem biblioteca.
Escolas mais pobres são predominantemente negras
Ainda, segundo a pesquisa, as escolas que acolhem os estudantes mais pobres são majoritariamente negras. No total, foram identificados 13 colégios. Estes espaços, localizados em zonas rurais do Amazonas (46,1%), Pará (30,7%), Maranhão (15,3%) e Amapá (7,6%) não dispõem de coleta de lixo e esgoto e um terço deles não têm acesso à água potável (69,2%) tampouco laboratório de informática, biblioteca e quadra de esportes (7,6%).
Já as escolas que possuem alunos com maior renda estão localizadas predominantemente em áreas urbanas de estados do Sudeste e Sul. Ao todo, são 32 instituições alocadas no Rio Grande do Sul (37,5%), São Paulo (28,1%), Paraná e Santa Catarina (12,5%) e Minas Gerais (9,3%).
A oferta de água potável é garantida em todas os colégios desta faixa de rendimentos. Os serviços de coleta de lixo e esgoto também estão presentes na maioria das unidades, com 81,2% e 59,3% de abrangência, respectivamente. Mais de 70% delas possuem biblioteca, quadra de esportes e laboratório de informática.
Jaqueline Barbosa, pedagoga, estudiosa de estratégias de uma educação antirracista, pontua que a pesquisa compõe uma série de investigações que tem apontado o quanto a discriminação racial mina a igualdade de oportunidades, afetando o direito à escolarização.
“Quando pensamos no recorte étnico-racial e suas interfaces com a educação, diversas questões devem ser consideradas como o ingresso e permanência, porém, elas se desdobram em outros elementos fundamentais como a qualidade do acesso. Obviamente, estar dentro das escolas e universidades é o primeiro passo, mas é preciso garantir que esta seja acompanhada por condições de permanência que garantam uma aprendizagem efetiva”, diz.
“Olhando os dados, constatamos que escolas frequentadas, majoritariamente, por estudantes brancos possuem mais acesso a laboratório de informática, por exemplo. O que isso quer dizer em termos de aprendizagem? Que os alunos negros não possuem a mesma disponibilidade de recursos, ou seja, há uma desigualdade nas condições de aprendizagem”, reforça.
De acordo com a especialista, é fundamental que ocorra a proposição de políticas públicas e programas que tenham como um dos eixos a diversidade étnico-racial. “As ações afirmativas são fundamentais não apenas no ensino superior, mas na educação como um todo. O estado tem o dever que garantir que a população negra, que vale lembrar é a maior parte do país, tenha não só acesso aos bancos escolares e universitários, mas à educação integralmente, ou seja, que disponham de todo suporte necessário e ofertado pelos poderes públicos”, observa.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.