Manifesto do Fórum Paranaense de EJA denuncia fechamento de unidades em Londrina e Cambé
O Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos da Região de Londrina divulgou um manifesto denunciando o fechamento de unidades de EJA (Educação de Jovens e Adultos) em Londrina e Cambé, a partir de 2025, por determinação do Núcleo Regional de Educação.
No documento, o Fórum acusa o governo de Ratinho Júnior (PSD) de promover um desmonte da educação para trabalhadores jovens e adultos, alertando para o impacto dessa decisão em comunidades vulneráveis e criticando as políticas educacionais adotadas pela SEED (Secretaria Estadual de Educação) que, segundo eles, têm causado queda no número de matrículas e aumento da evasão escolar.
Essa denúncia se insere em um contexto de enfraquecimento e desestruturação da EJA no Paraná, evidenciado pelos dados do Censo Escolar 2023, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Em cinco anos de gestão, o número de matrículas na modalidade caiu 75%, passando de 125.881 em 2019 para apenas 31.743 em 2023.
Segundo levantamento da APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná), desde 2019, a oferta de EJA ensino médio foi encerrada em 27 escolas, enquanto o corte na EJA ensino fundamental foi o dobro, afetando 54 locais.
De acordo com o professor e membro do Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos, Ivo Ayres, a educação de jovens e adultos vem sendo aceleradamente destruída pelo governo Ratinho Júnior. “Praticamente todas as semanas o Fórum Paranaense de EJA tem recebido notícias a respeito do fechamento de turmas, turnos e escolas desta modalidade da educação básica em todo o estado”, afirma o docente.
Ayres explica que os cortes mais recentes ocorreram em três comunidades da região de Londrina: Parque Universidade e Jardim Santa Fé, ambas em Londrina, e Jardim Santo Amaro, em Cambé. Esses locais abrigam as APEDs (Ações Pedagógicas Descentralizadas) coordenadas pelo CEEBJA Herbert de Souza.
“Desse modo, trabalhadores desses bairros e adjacências não poderão iniciar ou dar continuidade aos seus estudos tanto no ensino fundamental II do 6º ao 9º ano, quanto no ensino médio”, afirma.
O professor ressalta que o governo de Ratinho Júnior tenta justificar essas medidas alegando baixa frequência escolar, mas ele enfatiza que essa situação costuma acontecer aos finais de semestre, especialmente, após mudanças implementadas pelo governo na estrutura do sistema EJA, que dificultam a permanência dos trabalhadores nas escolas.
“Entre essas mudanças, está a que substituiu a oferta de matrículas por disciplina e a formação de turmas atendidas de forma coletiva ou individual pela organização de módulos semestrais rígidos, que dificultam a frequência e a conclusão das etapas de ensino, impondo, inclusive, horários de aulas totalmente inadequados para os trabalhadores”, diz.
O docente também destaca que uma barreira adicional para a continuidade do EJA é a exigência de um número mínimo de 20 matrículas para abrir novas turmas, e que essas adesões precisam ser feitas no final do ano.
Ele observa que muitos jovens e adultos que trabalham geralmente procuram por vagas no EJA no início do ano letivo, mas, neste momento, não há uma chamada pública organizada pela SEED para divulgar e orientar a matrícula dos estudantes.
Segundo Ayres, o Fórum Paranaense de EJA já apontava, há muito tempo, que tais mudanças na oferta desta modalidade da educação básica levariam ao aumento crescente do abandono escolar.
O professor afirma que essas medidas representam uma grave negação de direitos para quem não pôde estudar no tempo regular.
“Ratinho Júnior nega o direito público subjetivo de acesso à educação de todos aqueles que não puderam estudar em tempos passados e suprime o direito de cada um de concluir suas etapas de estudos nas escolas onde foram matriculados”, aponta.
Ivo também enfatiza que, enquanto o governo nega o direito à educação a esses estudantes, estimula o lucro do setor privado através da venda de cursos extras, visando apenas a certificação, sem prezar a qualidade do ensino ofertado.
“Ao mesmo tempo, incentiva a proliferação de cursinhos privados que lucram com a venda de ‘aulas’ preparatórias para o ENCCEJA [Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos] e obriga os CEEBJAs [Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos] a ofertarem a EJA à distância, que se traduz, na prática, em distribuição de certificação vazia, desprovida de efetiva educação escolar, servindo apenas para aumentar os índices de pessoas ditas “escolarizadas” no Paraná, contribuindo para fomentar a propaganda oficial do governo”, conclui.
Sonhos interrompidos
Para muitos alunos, o fechamento das unidades de EJA representa não apenas uma barreira para a continuidade dos estudos, mas também o impedimento de uma verdadeira mudança de vida.
Sérgio Santos, (42), aluno da EJA na escola Ruth Ferreira, localizada no bairro Parque Universidade, em Londrina, destaca o impacto que o fechamento dessa unidade significaria para ele e outros estudantes trabalhadores.
“Tem muita gente estudando comigo que trabalha o dia todo e chega à tarde. É muito corrido, mas a escola fica perto do nosso bairro, é a mais próxima que temos. Se fecharem, estarão fechando as portas para nós, porque vai ficar difícil continuar estudando. A gente vai estudar onde?”, indaga Sérgio.
Ele explica que, caso precise estudar em outra região, terá de abandonar os estudos por conta do trabalho. “Eu chego em casa às 14h30, a escola começa às 18h20. É uma correria com o tempo, imagina se tiver que ir pra longe? Não vou conseguir estudar porque o horário de trabalho não vai bater”, comenta.
Santos descreve as mudanças que os estudos trouxeram para sua vida: antes analfabeto, ele aprendeu a ler e a escrever no EJA, o que transformou sua rotina e autonomia.
“Se fecharem o EJA, é como se fechassem os nossos olhos também. Eu era cego, mas hoje estou começando a enxergar cada passo que dou na minha vida. Cada dia é uma vitória, porque agora consigo resolver minhas coisas, ler um endereço, entender o que está escrito sem depender de ninguém. Aprender a ler foi uma bênção de Deus, e o EJA abriu essa porta para mim. Fechar o EJA é acabar com o meu sonho e o sonho de muitas outras pessoas”, relata.
Como um homem negro, ter a oportunidade de estudo significa uma vitória. “Antes de existir isso, tinha tanto negro que não tinha estudo nenhum, e hoje, graças a Deus, com o EJA, a gente tá estudando bem”, enfatiza.
Além de sua própria história, ele destaca a importância do EJA para outros membros de sua comunidade. “Tem eu, mas tem gente vindo atrás também querendo estudar. E quem está tirando o EJA daqui, está acabado com a gente, acabando com a comunidade do bairro”, afirma o aluno.
Cada passo em direção à escola, para ele, é motivo de felicidade e esperança. “Cada dia que eu vou pra escola, eu me sinto feliz, eu me sinto bem, porque ali eu estou criando uma nova experiência, uma nova vida que tá renascendo em mim. Para quem não sabia nada, nada, nada, e hoje eu sei ler, escrever, é uma benção”, conclui Sérgio.
Leia na íntegra o manifesto:
NÃO FECHEM A MINHA ESCOLA DA EJA
O Fórum Paranaense de EJA da Região de Londrina vem a público novamente denunciar mais um ataque do governo de Ratinho Jr. contra a oferta de escolarização para trabalhadores(as) jovens e adultos. Nesta semana, por determinação do Núcleo Regional de Educação de Londrina (NRE/Londrina), está sendo anunciada a cessação de atividades da EJA no Parque Universidade e Jardim Santa Fé, em Londrina, e no Jardim Santo Amaro, em Cambé, a partir de 2025. Nestes locais, funcionam as Ações Pedagógicas Descentralizadas (APEDs), sob coordenação do CEEBJA Herbert de Souza de Londrina.
Desde 2019, o governo de Ratinho Junior, por meio da Secretaria de Estado da Educação (SEED/PR), vem sistematicamente implementando ações que dificultam o acesso e a permanência dos(as) trabalhadores(as) às escolas que ofertam a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e, mais recentemente, tem intensificado o fechamento de turmas, turnos e escolas desta modalidade de ensino, tanto as que atuam apenas no período noturno quanto os Centros Estaduais de Educação Básica para Jovens e Adultos (CEEBJAs).
O principal argumento utilizado pelo governo de Ratinho Jr. para promover o desmonte da EJA é o da infrequência e evasão escolar nas escolas que ofertam esta modalidade da educação básica de forma presencial. Porém, não reconhece que as principais causas da queda de matrículas foram as mudanças no sistema da EJA realizadas por este mesmo governo como a que, dentre outras medidas, substituiu a oferta de matrículas por disciplina e de formação de turmas atendidas de forma coletiva ou individual pela organização de módulos semestrais engessados que dificultaram a frequência e a conclusão das etapas de ensino, impondo, inclusive, horários de aulas totalmente inadequados para os(as) trabalhadores(as).
O Fórum Paranaense de Educação de Jovens e Adultos já apontava, há muito tempo, que tais mudanças na oferta da organização da EJA levariam ao crescente aumento do índice de queda de matrículas, fato comprovado pelos dados levantados pelo Ministério da Educação (MEC), mostrando que no período de 2019 a 2022, as matrículas da Educação de Jovens Adultos (EJA) caíram 59% na rede pública do Paraná e que, além disso, o estado, segundo o IBGE, lidera o ranking de analfabetismo na região sul do país.
Desse modo, Ratinho Jr. nega o direito público subjetivo de acesso à educação de todos(as) aqueles(as) que não puderam estudar em tempos passados e suprime o direito de cada um de concluir suas etapas de estudos nas escolas onde foram matriculados(as). Ao mesmo tempo, incentiva a proliferação de cursinhos privados que lucram com a venda de “aulas” preparatórias para o ENCCEJA e obriga os CEEBJAs a ofertarem a EJA à distância, que se traduz, na prática, em distribuição de certificação vazia, ou seja, desprovida de efetiva educação escolar, servindo apenas para aumentar os índices de pessoas ditas “escolarizadas” no Paraná, contribuindo para fomentar a propaganda oficial do governo.
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Matéria da estagiária Fernanda Soares sob supervisão.