“O pessoal esquece que aí temos crianças com problemas respiratórios no bairro, que são os idosos, gestantes e vários tipos de pessoas com problemas porque a gente anda com o cheiro da fumaça, né?”
“Porque aqui é fumaça 24 horas por dia. Enquanto você acha que não está tendo mais fogo, começa a queimar tudo de novo.”
As falas acima são de Adriely Gonçalves, 24, mãe de duas crianças e moradora do Jardim Nova Esperança, zona Sul de Londrina. Não é incomum ouvirmos ou nos fazermos as mesmas reclamações ao longo da semana, sobre um ou outro foco de incêndio.
É cheiro de fumaça na roupa, é fuligem no quintal, é gente tossindo, é um ar quente que não tem fim. Mas afinal, você sabe o porquê das causas de tanto incêndio?
Causas
Segundo José Paulo, mestre e gestor em Meio Ambiente, as queimadas estão sendo um desafio na região desde o ano passado. “O problema das queimadas por aqui já dura desde agosto, teve um breve rompimento com chuvas em outubro, novembro e dezembro, mas janeiro e fevereiro trouxeram uma seca novamente, resultando em mais incêndios”, diz.
Quando questionado sobre as causas, o gestor destaca que há três tipos principais de incêndios atualmente.
A primeira é por Gás Metano. Aquela famosa história dos gases liberados em grandes quantidades pelas vacas [importante destacar que as ovelhas e búfalos também produzem metano em seus sistemas digestivos durante a fermentação entérica].
Em segundo está a Agro. Imagine uma fazenda agrícola ou um pasto extenso onde o gado pasta, agora, nas áreas onde a agricultura é intensiva ou onde os pastos são extensos, é comum haver o acúmulo de resíduos orgânicos, como restos de plantas e palha. Esses resíduos são frequentemente queimados como uma prática agrícola para limpar os campos para o próximo plantio ou para renovar os pastos para o gado.
Em terceiro lugar temos o Cidadão. Seu vizinho, primo ou amigo, que decide queimar alguns resíduos no quintal, um terreno ou entulho.
José Paulo também ressalta a ineficácia da coleta de lixo na cidade, observando que, apesar da programação regular para a coleta, frequentemente, o serviço deixa a desejar. Isso resulta no acúmulo de lixo, que, por sua vez, acaba sendo incendiado pela população.
“O problema não é unilateral. Tanto a população urbana quanto os agricultores são responsáveis. Embora algumas práticas agrícolas, como o plantio direto, minimizem os riscos, muitos agricultores ainda utilizam o fogo para limpar áreas não utilizadas, especialmente após a colheita da colheita soja”, explica José.
Fiscalização
Em Londrina, a falta de fiscalização se tornou um convite à impunidade para aqueles que desrespeitam as leis ambientais, contribuindo para a persistência dos problemas de queimadas e descarte irregular de lixo.
Embora existam números de telefone e canais online para relatar crimes ambientais, como o 181 e a Ouvidoria da Polícia do Estado, sua eficácia é questionável, já que só são acionados em casos de flagrante.
Além disso, a escassez de pessoal e recursos compromete a capacidade das autoridades de aplicar as leis ambientais de forma efetiva. “Tem pouca gente que vai trabalhar, então ninguém vê nada, ninguém chega nada e acaba acontecendo. Mas isso é falta de desempenho do próprio IAP [Instituto Ambiental do Paraná]”, pontua o gestor ambiental.
Para o especialista, “sem uma fiscalização rigorosa e constante, as pessoas se sentem menos incentivadas a seguir as regras e ações irresponsáveis permanecem impunes. Além disso, a falta de fiscalização pode levar a uma sensação de impunidade, incentivando ainda mais comportamentos inadequados. Isso cria um ciclo vicioso em que a falta de fiscalização leva a mais violações das leis ambientais, o que por sua vez agrava os problemas ambientais”, adverte.
É essencial que as autoridades aumentem os esforços de fiscalização e apliquem medidas punitivas de forma consistente e eficaz. Isso não apenas dissuadirá indivíduos e empresas de violar as leis ambientais, mas também ajudará a proteger o meio ambiente e a saúde pública a longo prazo.
População
Além de pressionar as autoridades por uma fiscalização mais eficaz, a população também pode desempenhar um papel importante no combate às queimadas. José Paulo enfatiza a importância do engajamento cívico e da conscientização pública como ferramentas para promover a mudança. “É fundamental que cada cidadão se sinta responsável pela proteção do meio ambiente em sua comunidade”, destaca.
Isso inclui a denúncia de atividades ilegais, como queimadas não autorizadas e descarte inadequado de resíduos, às autoridades competentes. Além disso, é essencial adotar práticas sustentáveis no dia a dia, como a separação correta do lixo e o uso consciente dos recursos naturais.
O gestor ressalta que a educação ambiental também desempenha um papel fundamental. “Precisamos conscientizar as gerações futuras sobre a importância da preservação ambiental e dos impactos negativos das queimadas e do descarte irresponsável de lixo”, observa.
Isso pode ser feito por meio de programas educacionais nas escolas, campanhas de conscientização pública e eventos comunitários focados na proteção do meio ambiente.
Matéria da estagiária Joyce Keli dos Santos sob supervisão.