Alojamento, em situação degradante, tinha apenas um pouco de arroz, farinha, orelha e pé de porco deixados por um dos próprios intermediadores de mão de obra, que ficou com pena dos trabalhadores
Operação conjunta de fiscalização no município de Guariba, no interior paulista, resgatou 18 migrantes em situação de trabalho análogo à escravidão. Além de condições degradantes, faltava até comida nos alojamentos.
Localizada a 50 quilômetros de Ribeirão Preto, a cidade de Guariba foi palco de uma paralisação que se tornaria emblemática, conhecida como “greve dos boias-frias”, em maio de 1984. O nome é referência às refeições dos trabalhadores, que já estariam frias na hora da refeição. O movimento se espalhou pela região, e sofreu repressão policial, que resultou em 30 feridos e um morto. Mas se tornou marcante pela mobilização por direitos, no período de redemocratização do país, que naquele ano completava duas décadas de ditadura.
Passagens pagas do próprio bolso
Na operação deflagrada na última sexta (8), foram encontrados 17 homens e uma mulher em situação de trabalho escravo. Segundo o Ministério Público do Trabalho, na maioria vindos de Maranhão. Estavam “distribuídos em dois alojamentos, sob a responsabilidade de dois turmeiros (intermediadores de mão de obra)”, e prestavam serviços em dois sítios arrendados por uma empresa do mesmo grupo (Usina Nova Era). Além do MPT, participaram da ação o Ministério do Trabalho e Previdência e Polícia Federal.
“Os cortadores foram trazidos do Maranhão pelos turmeiros, em ônibus clandestinos, pagando as passagens do próprio bolso, com a promessa de trabalho e remuneração dignos por 3 meses”, relata o MPT. “Chegando em Guariba, o empregador alertou que pagaria apenas o primeiro mês de aluguel dos imóveis, e que eles teriam que manter as moradias e a alimentação por conta própria.”
Sem registro e sem comida
Nenhum trabalhador teve registro em carteira, nem recebeu equipamentos de proteção individual (EPIs) ou ferramentas para trabalhar. Os alojamentos estavam “em situação extremamente degradante”, de acordo com a fiscalização. “Tratava-se de casebres antigos, com forte odor e sujeira em seu interior. No momento da operação, um dos alojamentos estava sem fornecimento de água por falta de pagamento. Todos os trabalhadores dormiam em colchões no chão, muitos deles com baixa densidade (finos), não oferecendo qualquer conforto.”
Além disso, não havia armários. Com isso, os trabalhadores deixavam os pertences no chão. E também não foram encontrados alimentos, “exceto um pouco de arroz e farinha, além de um pacote de carne, contendo orelha e pé de porco, cedido por um dos turmeiros que se ‘compadeceu’ com a situação dos trabalhadores.”
Todos foram levados para abrigos mantidos pela prefeitura de Ribeirão Preto. As partes envolvidas na exploração foram chamados à Gerência Regional do Trabalho, mas só a intermediadora compareceu. Assim, devido à situação considerada emergencial, “foi assumida responsabilidade solidária pelo cumprimento de obrigações relativas ao pagamento de despesas de transporte (da origem e do retorno) e de dano moral”, no valor de R$ 2 mil para cada trabalhador.
Eles devem retornar a seus municípios de origem até a próxima sexta-feira (15). “As apurações em relação as responsabilidades das outras duas empresas seguem em andamento, bem como as tratativas quanto ao pagamento das verbas rescisórias, dano moral coletivo e demais obrigações”, informa ainda o Ministério Público.
Fonte: Redação CUT