Em 5 de julho de 2022 foi publicado aqui no Portal Verdade o artigo “Déficit de moradia: 456 anos para atender a demanda atual em Londrina”. Ali foi mostrado, com uma conta simples, quantos anos o total dos que estão cadastrados na COHAB-LD esperará para conseguir sua moradia. O resultado, 456 anos, explicita a falta completa de uma política habitacional que possa atender essa demanda, considerando o período entre 2015 e 2020, com os dados apresentados à Câmara de Vereadores pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil – IAB, núcleo de Londrina.
Como o Brasil teve uma política habitacional que entregou mais de 4 milhões de moradias entre 2009 e 2016, com o Programa Minha Casa Minha Vida, se faz importante estender a abrangência do período para ter outra dimensão da situação colocada. A pequena quantidade produzida entre 2017 e 2022 e o programa Casa Verde Amarela, será objeto de artigo específico.
Nos 13 anos compreendidos entre 2010 e 2022 foram entregues 10.040 unidades em Londrina, perfazendo uma média de 772 unidades por ano de moradias, regularizações fundiárias e outras formas de acesso à habitação. Por outro lado, a quantidade de inscritos na COHAB-LD em 2022 chegou a 58.799 pessoas, conforme consta na tabela do número de inscritos para cadastro de aquisição de moradia e número de contemplados – Londrina – 2016 a 2022, página 60, do Perfil de Londrina de 2023.
Considerando a média desses 13 anos e o total de inscritos é possível deduzir que serão necessários mais de 76 anos para atender totalmente a atual demanda. É bem menos que o tempo necessário quando considerado o período analisado anteriormente. Entretanto, continua sendo muito tempo. A diferença entre um período e o outro nos mostra que é possível alterar de forma substancial essa espera. Para isso, é fundamental o financiamento público e que este tenha um regramento para atender quem de fato necessita, impedindo que especuladores se aproveitem dos subsídios para aumentarem seus lucros.
Todos precisam de moradia, como afirmado no artigo mencionado. Entretanto as famílias com renda superior a 3 salários mínimos têm várias modalidades de financiamento que possibilitam o acesso à moradia desde o início de suas vidas familiares. Mesmo tendo que pagar o financiamento por 20 a 30 anos, elas podem usufruir da moradia desde o início, pois não dependem de uma poupança anterior, mas do que pagarão ao longo desse tempo, que muitas vezes é menos que o aluguel de imóveis equivalentes, dependendo da localização e características desses.
Sabe-se que a construção civil gera enorme quantidade de empregos, movimenta uma cadeia muito grande de produtos, desde a areia e a pedra, que são extraídos e utilizados com pouquíssima transformação, até produtos eletrônicos, como os disjuntores, por exemplo, que são de alta tecnologia, passando pelo aço, cimento, fios e cabos elétricos, tubos, conexões e metais, madeira, cerâmica em diversas formas de produtos, etc.
Sem falar nas máquinas, equipamentos, veículos e acessórios que são utilizados no processo de produção da moradia. Se ampliarmos a abrangência para a cidade, os setores envolvidos aumentam ainda mais. Isso para entendermos a importância que esse ramo industrial tem para o país e para a geração de emprego e renda, bem como na melhoria dos indicadores econômicos e sociais, como o Produto Interno Bruto (PIB) e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), pois garantir condições de moradia adequada leva à melhoria da saúde da população e elevam a qualidade de vida como um todo.
Existe a possibilidade de fazer muito mais moradias em tempo bem menor. Um dos instrumentos possíveis, constante no Estatuto das Cidades, regulamentado em lei federal desde 2008, precisa ser implantado no município. Para sua plena utilização pela população que necessita de moradia e não tem acesso por ter renda até 3 salários mínimos, é preciso de Lei Municipal. Trata-se da Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social, a ATHIS, regulamentada pela Lei Federal nº 11.888/2008, prevista na alínea r do inciso V do caput do art. 4º da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal.
A aprovação desta lei em Londrina poderá iniciar uma alteração radical deste cenário, possibilitando colocar uma meta ousada para zerar o déficit habitacional do município, que seria de 10 anos. A meta é: Sem déficit habitacional nos 100 anos de Londrina!
Gilson Bergoc
Doutor e Mestre pela FAU USP. Arquiteto e Urbanista, docente da Universidade Estadual de Londrina na área de urbanismo e planejamento urbano e regional. Integrante do Conselho Municipal de Planejamento e Gestão Urbana. Coordenador de Projeto Integrado – Pesquisa e Extensão da UEL e do núcleo de Londrina do BR Cidades. Ex-Prefeito do Campus da UEL e ex-Diretor de Planejamento Físico Territorial do IPPUL.