Edital 02/2022 é suspenso, mas no mesmo dia Edital 03/2022 é publicado, possibilitando a gestão de escolas estaduais pela iniciativa privada
Na última quinta-feira (10), o governo Ratinho Júnior (PSD) suspendeu o Edital 02/2022. O documento responsável por criar o programa “Paraná Parceiro”, estabelecia o credenciamento de empresas privadas a fim de que assumissem a administração de 27 escolas públicas no estado. Porém, no mesmo dia foi publicado no Diário Oficial, processo seletivo substitutivo. O Edital 03/2022 já estar no ar.
Walkiria Mazeto, presidenta da APP-Sindicato, explica que o certame anterior possuía uma serie de irregularidades, não sendo aprovado, primeiramente, pelo Conselho da Paraná Educação, proponente do Edital. Contudo, a liderança pontua que, mesmo atendendo a algumas das correções solicitadas, o novo Edital 03/2022 mantém a transferência da gestão das escolas estaduais para a iniciativa privada. Para ela, uma das principais preocupações é com oferta de uma educação de qualidade, visto que o objetivo do empresariado é, primeiramente, obter lucro.
“Então, nesta quinta-feira, o Edital foi cancelado, mas no mesmo Diário Oficial, na mesma página, eles já lançaram o Edital 03, com a mesma finalidade, apenas fizeram alguns ajustes e correções que várias entidades estavam apontando como nós [APP-Sindicato], Conselho Estadual de Educação e outros. Mas manteve o central que é passar a gestão de 27 escolas públicas para a iniciativa privada. Nós temos mantido a contrariedade, entendendo que as empresas privadas têm por finalidade ter lucro e ao pegar as escolas públicas para fazer gestão, elas vão querer ganhar o dinheiro oferecido e não ter a preocupação com a oferta da educação para aqueles e aquelas que mais necessitam dela”, analisa.
Segundo informações do boletim da APP-Sindicato, outra adequação foi a ampliação do cronograma, já que as empresas não teriam tempo hábil para organizarem a documentação e cumprir as etapas da seleção, visto o curto período entre a publicação e fim das inscrições determinado pelo governo estadual, o que demonstra a gerência autoritária das políticas educacionais por Ratinho Júnior, sem contemplar a participação popular.
A medida vem também após intensa mobilização de coletivos. Na segunda-feira (7), ocorreu audiência pública intitulada “Terceirização do ensino público estadual”. A atividade proposta pelo deputado estadual Professor Lemos, representante do Partido dos Trabalhadores (PT), contou com a participação que de diversas associações como Confederação Nacional dos Trabalhadores (CNTE), União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (UPES), APP-Sindicato, Defensoria e Ministério Público.
Alunos, pais e demais membros da sociedade civil também ocuparam as galerias da Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP). Representantes do governo Ratinho Júnior, apesar de convidados, não comparecem. Mazeto observa a agenda de luta firmada a fim de chamar a atenção para a iniciativa que, segundo a dirigente, coloca “a venda” escolas estaduais. Ela também ressalta que o projeto apresentado como piloto tende a ser expandido.
“Nós já nos organizamos e enviamos as denúncias ao Ministério Público. Em nossos Núcleos, os dirigentes têm feito reuniões com as comunidades escolares. E realizamos na última segunda-feira, audiência pública, onde diversos outros atores também fizeram denúncia sobre o Edital. As Defensorias Públicas da Criança e do Adolescente, da Educação, o próprio Ministério Público da Educação na sua Promotoria. Nossos conselheiros do acompanhamento do financiamento escolar, vários outros foram apontando as consequências e riscos deste Edital ser colocado em prática”.
Em Londrina, as escolas indicadas pela SEED para a gestão terceirizada são: Colégio Estadual Professora Lúcia Barros Lisboa, Colégio Estadual Professora Olympia Morais de Tormenta, Escola Estadual Rina de Francovig e Escola Estadual Roseli Piotto. Na sexta-feira (11), dirigentes da APP-Sindicato promoveram reunião com as comunidades escolares das três escolas da zona norte para debater os impactos do Edital com os trabalhadores da educação, estudantes e demais membros da sociedade civil.
Para Mazeto uma dos reflexos da iniciativa é a ampliação das desigualdades socioeducacionais. “A escola pública deve servir a população para atender todos e todas que precisam dela. Não dá para a gente ter uma empresa privada que assume a escola de um bairro e a partir disso possa escolher quem vai estudar, pedir para se retirar da escola aquele que não se encaixar ou não trazer os resultados que esta empresa espera”, alerta.
Entre as vantagens apresentadas pela direção de grupos empresariais está apontada “gestão com metas e desempenho”. O estado oferecerá R$ 800,00 por aluno matriculado para suprir gastos com infraestrutura e pagamento de trabalhadores. Estimativa publicizada pela APP-Sindicato, indica que o projeto custará, em um ano, mais de R$ 2 milhões aos cofres públicos.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.