Evento discutiu anticolonialismo e reivindicou defesa de direitos da classe trabalhadora e demais grupos subalternizados
Na última semana, entre os dias 22 e 24, ocorreu a edição 2024 da Jornada Latino-Americana e Caribenha de Integração dos Povos. O evento reuniu aproximadamente 4 mil participantes, oriundos de mais de 20 países, no Centro de Convenções de Foz do Iguaçu.
Delegação composta por cerca de 30 pessoas, entre representantes sindicais, lideranças de movimentos sociais e estudantes, saiu de Londrina rumo à Tríplice Fronteira para acompanhar a programação composta por místicas, conferências, mesas, atos e apresentações culturais (confira abaixo matérias produzidas pelo Portal Verdade). A viagem foi custeada pelo Coletivo de Sindicatos de Londrina.
“Ouvindo os relatos dos mais diferentes países que compõem esse encontro da Jornada, a gente vê se repetir o mesmo avanço do capital sobre os trabalhadores, não só da educação, mas todos os trabalhadores gerais, onde você tem a destruição das profissões. Dos direitos trabalhistas em todos os países, tudo em nome do capital para manter um lucro incessante”, pontua Gilberto Mille, professor, representante da APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná).
A avaliação de que o evento cooperou para mobilizar as categorias contra o desmantelamento de legislações trabalhistas, a exemplo das Reformas Trabalhista e da Previdência realizadas por Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), respectivamente, também é compartilhada por Adirley Ezequiel, membro do Sindicato dos Bancários de Londrina e da FETEC-PR (Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Paraná).
“Tive a oportunidade de conhecer a verdadeira realidade dos trabalhadores, na variedade das atividades, mas buscando um objetivo comum de podermos nos organizarmos mais politicamente, em defesa de todo trabalhador e trabalhadora frente a estas novas políticas, tantas mudanças que a gente vem sofrendo”, indica.
Ainda, os dirigentes destacam a importância do evento para o fortalecimento do movimento sindical não apenas no Brasil, mas nos demais países do Sul Global bem como para a criação de uma frente ampla, internacional entre os trabalhadores e outros coletivos. “Construir uma relação de amizade que possa um apoiar o outro e assim construirmos uma força que vai fazer enfrentamento a esse capital avassalador que quer nos destruir”, diz Mille.
“O evento em si marca a retomada das organizações amplas entre as entidades populares do campo, da cidade, estudantis, além de intelectuais com suas palestras. Tivemos conferências de diferentes eixos temáticos, além das atividades políticas e culturais. Espero poder participar de outras edições”, acrescenta Ezequiel.
Autoridades como o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, o ex-presidente do Uruguai, Pepe Mujica, e a vice-presidenta da Colômbia, Francia Márquez, primeira mulher negra a ocupar o cargo também marcaram presença.
A diversidade em prol da unidade
Josemar Lucas, ator, educador, conselheiro estadual da APP-Sindicato e integrante do Movimento de Artistas de Rua de Londrina ressalta a diversidade de grupos reunidos nestes dois dias, porém, sinaliza a necessidade de garantir recursos para que mais frentes possam comparecer.
“Sempre muito bom ver a diversidade e a força dos movimentos sociais do Brasil e de outros países, o processo de organização e execução de eventos como esse é um aprendizado e nos demonstram onde estamos e para onde devemos ir no enfrentamento de nossos desafios. A Jornada se mostrou muito potente pela representatividade, se a gente conseguir otimizar os recursos e como Pepe [Mujica] disse, ampliar a participação, proporcionar outras segmentos, é muito importante”, observa.
Ele também indica as contribuições da Jornada para a formação política, principalmente, considerando as relações geopolíticas. O desafio torna-se ainda maior, visto os interesses e a perspectiva eurocentrada e estadunidense disseminada as demais partes do mundo como universais.
“É um evento que além de nos organizar da conjuntura nos dá ferramentas para continuar na defesa dos nossos direitos e, sobretudo, levando para a classe trabalhadora essa leitura mais macro. Pensar nosso local de trabalho é uma questão, nossa cidade, estado, país são outras, e pensar a América Latina e como nos integramos irá nos fortalecer na luta anticapitalista e anti-imperialista”, analisa.
Palestina Livre
Além das discussões sobre os desafios e potencialidades da América Latina e Caribe, Maria Giselda de Lima Fonseca, assistente social, coordenadora geral da Comissão de Saúde e do Centro de Direitos Humanos de Londrina e membra do Comitê Popular de Luta Brasil Livre Calçadão, chama atenção para o apoio dado ao povo palestino face à violência praticada pelo Estado de Israel.
“Eu acho que a avaliação do evento é que foi além de um evento. Eu acredito que, para muita gente ali, foi um curso de informação. Você, às vezes, ouvir, assistir algo pela internet, pelo Facebook, é uma coisa, mas você ali vendo as pessoas, representantes falando na sua frente o que realmente está acontecendo tem outro significado, eu acho que a gente acaba assumindo um outro compromisso no sentido de garantia, de continuar a luta não só aqui no Brasil, mas uma luta dos povos em defesa de todos os nossos países que estão sofrendo”, assinala.
Encerrando as atividades na última quinta-feira (22), aconteceu ato em solidariedade à Palestina. Na ocasião, o jornalista , Breno Altman, fez o lançamento de seu novo livro “Contra o Sionismo: retrato de uma doutrina colonial e racista”. Em seguida, a questão palestina foi debatida pelo professor de Relações Internacionais e especialista em Oriente Médio Renatho Costa, da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), e Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal).
Fonseca reafirma o papel da articulação entre governos e organizações progressistas com o intuito de frear o avanço da extrema-direita a nível mundial e, especialmente, nas eleições municipais que ocorrem no Brasil neste ano.
“Eu acredito que foram pontos importantíssimos para que cada um e cada um que volte às suas origens, aos seus municípios e possa estar organizando movimentos, atos, enfrentamentos para derrubar a extrema-direita, porque senão a gente acaba perdendo muito espaço. Acho que todos ali saíram com um compromisso maior de não permitir que a extrema-direita assuma um papel de derrubada à esquerda, o nosso papel agora, daqui para frente, são lutas mais amplas”, convoca.
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Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.