Líder do governo na Assembleia disse que, em caso de divergência no novo modelo do pedágio, Paraná vai “cuidar das suas rodovias”
A não-reeleição do aliado Jair Bolsonaro criou obstáculos ao modelo de pedágio desenhado nos últimos anos por Ratinho Jr. (PSD) e o extinto Ministério da Infraestrutura. Prevendo não ter o esquema referendado pela nova gestão em Brasília, o governador do Paraná pensa em adotar um plano B para retomar as rodovias do estado já concedidas ao governo Federal para um pacote único e submetê-las à licitação ele próprio.
A informação veio do líder do governo na Assembleia Legislativa (Alep), Hussein Bakri (PSD). Em sessão nesta segunda-feira (6), o parlamentar transmitiu o que teria sido decisão do governador de estabelecer ao Ministério dos Transportes o prazo de 31 de março para uma definição sobre o tema. Caso contrário, o Paraná “vai ficar com as suas rodovias”, e o governo Federal, com as dele. No desenho em discussão, 35% das rodovias incorporadas ao pacote são estaduais, equivalente a um total de 1,2 mil quilômetros.
O Palácio Iguaçu não confirmou – nem negou – e disse estar confiante sobre ter endossada sua proposta de delegar para a União rodovias estaduais dos dois primeiros lotes e sobre a possibilidade de que o edital seja divulgado em breve.
E apesar de a fala no plenário ter gerado burburinhos, ela torna pública uma ideia que já vem sendo tecida nos bastidores. A divergência entre os governos Lula e Ratinho sobre qual é a melhor forma de conceder os novos lotes rodoviários levantou debates paralelos entre lideranças políticas e empresariais – e a possibilidade de que as PRs sejam geridas pelo estado e a União seja responsável apenas pelas BRs que cruzam o Paraná é algo que não soa mais como novidade.
“Acho que, em não havendo esse entendimento, tem de se iniciar de fato essa reflexão e não esperar muito para fazer isso porque pode ser que a gente não tenha essa convergência”, comentou o deputado Evandro Araujo (PSD). “Todos estamos fazendo o esforço de tentar este entendimento, mas será que o Paraná não terá prejuízo por fazer um projeto assim tão grande?”.
Pedágio no Paraná em contradição
Do púlpito, as declarações do líder de Ratinho manifestaram o tremendo desconforto que a eleição do petista Luiz Inácio Lula da Silva causou para a nova gestão do político em relação ao pedágio.
O desenho energicamente defendido pelo chefe do Executivo patina em uma série de contradições apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Seriam pelo menos 30 fragilidades que poderiam comprometer a sanidade do sistema já a médio prazo, entre elas cálculos que indicam uma projeção de tarifas médias até 13% maiores do que os da antiga concessão, apesar de o Palácio Iguaçu rechaçar e afirmar se tratar de um sistema “justo e transparente”.
“O Paraná teve, ao longo de mais de duas décadas, um dos pedágios mais caros do Brasil. Nosso desafio era construir um modelo que chegasse a um desconto maior, com uma tarifa justa e também com muita obra”, afirmou Ratinho na ocasião do lançamento da nova modelagem, em agosto de 2021.
O modelo trazido à público pelo governador e estabelece a obrigatoriedade de investimentos para evitar que as obras previstas nos contratos deixem de ser entregues, cria 15 novas praças de pedágio e promete tarifas até 50% mais baratas, embora apontamentos técnicos questionem se, de fato, o custo realmente cairá como previsto. A proposta ainda determina a cobrança de um aporte financeiro a cada estágio de desconto sobre a tarifa a ser apresentado pela concorrente, o que, para críticos, diminuiria a competitividade e tornaria mais fácil a vitória no certame de grandes empresas do setor, como as que operaram as rodovias do estado nas duas últimas décadas.
Tudo isso está sendo levado em consideração por autoridades e técnicos em Brasília, onde diálogos têm ocorrido intensamente desde o começo do ano.
Nesta segunda-feira, os deputados estaduais Arilson Chiorato (PT) e Luiz Claudio Romanelli (PSD), da Frente Parlamentar do Pedágio instalada na Alep, estiveram em reunião com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, para discutir o assunto. Na mesa também estiveram os deputados federais petistas Enio Verri e Gleisi Hoffmann, presidenta nacional do PT, e o o economista da UFPR Luiz Antonio Fayet, um dos coordenadores sobre o estudo do modelo de pedágio desenvolvido pelo Instituto Tecnológico de Transportes e Infraestrutura (ITTI).
De acordo com Chiorato, Costa teria ficado “sensibilizado” com os “apontamentos técnicos que reforçam a necessidade de revisão do modelo defendido pelo governador Ratinho Jr”. “O processo, como está, criou instrumentos contratuais que beneficiam as concessionárias em detrimento do interesse dos usuários”, disse o parlamentar.
Na semana passada, Ratinho também chegou a viajar à Brasília para uma nova rodada de defesa do projeto, que ele define como “justo e transparente”. Enquanto isso, seus deputados de base buscaram meios para anular o protagonismo da Frente Parlamentar do Pedágio, que acusa a modelagem proposta de ser prejudicial aos cofres públicos.
No fim de fevereiro, o grupo enviou ao governo Lula um documento com propostas de mudanças da modelagem. No relatório, os integrantes da atual Frente sugerem o fim da exigência de aporte financeiro prevista no modelo cocriado entre o governador do Paraná e a gestão de Jair Bolsonaro. De acordo com o deputado Chiorato, coordenador da Frente, o esquema já apresentado pelo Executivo paranaense custará R$21 a cada 100 km”, enquanto o valor do sistema antigo – bastante abalado por esquemas de corrupção e famoso por estar entre as maiores tarifas do país – era de R$ 19 a cada 100 km.
Embora não confirme estar estudando a retomada das rodovias estaduais concedidas para o modelo desenhado, em caso de o governo Federal não referendar o esquema, o Palácio Iguaçu também não negou a possibilidade.
Em nota, afirmou “seguir confiante de que o modelo acordado com o Ministério dos Transportes, discutido em uma série de encontros entre técnicos das duas partes em janeiro e fevereiro, será mantido”. “As partes envolvidas no processo, inclusive a sociedade civil, ouvida em duas audiências públicas oficiais e em reuniões com a Assembleia Legislativa, entenderam que a concessão por menor tarifa, sem outorga e com uma grande quantidade de obras é a melhor”, diz o texto. “O leilão será pela menor tarifa, com disputa livre pelo mercado, com um aporte financeiro em relação ao desconto concedido, chamado de seguro-usuário, para garantir a execução do acordo”.
Fonte: Jornal Plural