Mesmo com defasagem, especialistas destacam a importância da escolaridade para melhoria da renda e maiores chances de inserção no mercado de trabalho
De acordo com informações dos Ministérios da Educação e do Trabalho, um em cada 10 formados em ensino superior ocupa vaga de nível médio. A pesquisa considera apenas contratações formais, ou seja, via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). O ano de referência é 2018.
Entre cursos mais procurados como Pedagogia, Direito, Administração, menos de 9 mil dos quase 67 mil formados conquistaram cargos condizentes com a formação. O índice representa apenas 12% dos estudantes matriculados.
Entre graduados em Enfermagem, somente 7% estão em posições consideradas de nível superior. A exceção foi o curso de Medicina, onde todos os formados estão ocupando vagas conforme a escolaridade, segundo a pesquisa.
Ainda, com base no mapeamento, cargos como assistente administrativo, auxiliar de escritório e auxiliar de serviços jurídicos — todos com nível de ensino médio — são os mais frequentes na contratação de graduados no curso de Direito, enquanto em Administração, apenas 3% ocupam vagas de nível superior.
Uma das principais consequências para o trabalhador é a diferença salarial. Remunerações de profissionais com nível superior tendem a ser mais altas do que às oferecidas a trabalhadores admitidos em nível médio como assistentes e auxiliares.
“Aconteceu que teve um aumento no número de vagas nas universidades públicas e privadas e o número de ocupados com diploma aumentou, mas o mercado de trabalho não conseguiu acompanhar essa dinâmica. Então, não têm postos de trabalho suficientes para conseguir absorver esta mão de obra qualificada que cresceu muito nos últimos anos”, explica Gustavo Monteiro, técnico do DIEESE (Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).
“Os outros países que temos referências são muito diferentes. Tanto o mercado de trabalho como o sistema educacional de outros países são muito diferentes, então, vemos países que mais metade da população tem ensino superior, mas eles têm mercado de trabalho mais formalizados, desigualdade menor. No caso do Brasil este problema é dramático porque tem uma desigualdade muito grande”, acrescenta Monteiro.
De acordo com o especialista, além do aumento da qualificação também é necessário propiciar programas de ingresso no mercado de trabalho formal a fim de reduzir as múltiplas desigualdades que atravessam as trajetórias dos indivíduos.
“Esses dados mostram que não basta aumentar a oferta de educação porque mesmo quando as pessoas conseguem acessar e concluir o ensino superior, as desigualdades continuam por muitos motivos, não é só a educação que determina o trabalho e rendimento das pessoas. Então, aquelas pessoas que vem de lares mais ricos conseguem se beneficiar de redes de contato melhores, conseguem estudar em universidades melhores e até em cursos em que a renda é maior, isso faz com que consigam não apenas ter um acesso melhor à educação, mas também uma inserção melhor no mercado de trabalho”, alerta.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.