Para o especialista, avanço na legislação ajudou iniciativa a ganhar corpo
Passados dez anos das jornadas de junho de 2013, que começaram como protestos contra aumento de passagens no transporte público e com a reivindicação de “tarifa zero”, a iniciativa, antes vista como “utópicas”, já se tornou realidade em 74 municípios do Brasil, sendo dez no Paraná, em cidades como Araucária, Paranaguá e Matinhos.
Para o deputado da base governista de Ratinho Jr (PSD) Luis Cláudio Romanelli, que chegou a promover uma audiência pública na Assembleia Legislativa a respeito do tema, o transporte coletivo urbano “virou um gargalo” para a gestão pública. “Entramos em um ciclo vicioso de tarifas altas e perda de usuários, sem falar na ineficiência das frotas e de modelos operacionais, que provocam muito desconforto aos usuários com atrasos das linhas ou superlotação nos horários de pico”, afirmou.
Já o professor e doutor em Economia pela federal do Paraná, UFPR, e autor do livro “Movimento Popular e Transporte Coletivo em Curitiba”, Lafaiete dos Santos Neves, a reivindicação de 2013 ganhou força graças a problemas estruturais. “Qual fenômeno está acontecendo? É o abandono no transporte coletivo pelos trabalhadores, porque eles precisam pesar na balança se vão gastar com alimentação ou o transporte. Procuram meios alternativos, indo trabalhar a pé, de bicicleta, motos ou por aplicativos”, analisa.
Outro fator citado pelo professor é a entrega de concessões. “As empresas de médias e pequenas cidades estão entregando as concessões, e os prefeitos estão tendo que assumir para proteger a economia local. Com a ‘Emenda Erundina’ e a elevação do transporte coletivo a um bem social equivalente a saúde e educação, o serviço pode estar no orçamento público”, afirma.
Curitiba
Em maio deste ano, a Câmara de Vereadores de Curitiba debateu a gratuidade no transporte da cidade em audiência pública. A capital tem a tarifa mais cara do País, R$ 6. A departamento que controla o serviço pela Prefeitura, a URBS, argumenta que a aplicação da tarifa zero na cidade custaria cerca de 20% do orçamento municipal, R$ 2 bilhões por ano. Para o presidente da URBS, Maia Neto, apesar do custo, a proposta não é impossível. “A tarifa zero não é impossível, mas isso depende de onde é instalada. Quando Quatro Barras instituiu a tarifa zero, criou três linhas de transporte, que conseguem fazer com que a cidade seja integrada em um ponto, gratuitamente. A cidade custeia essas três linhas, com cinco ou seis ônibus, e um custo que a cidade conseguiu absorver”, disse.
O presidente do órgão ainda argumenta que a gratuidade poderia levar a uma desintegração do sistema, caso não haja suporte da Região Metropolitana. “Certamente, a integração metropolitana vai reduzir, sobremaneira, a redução dos custos. Nós passaremos a dividir a responsabilidade de todo o sistema. Curitiba integra todas as cidades da RMC. Recebemos, aproximadamente, 3,5 milhões de pessoas dentro do nosso sistema, diariamente, e nós precisamos fazer o deslocamento delas. Precisamos dar conta disso”, afirma.
Subsídios
Para Lafaiate, a tarifa zero tem sido descaracterizada por prefeituras e empresários. “Tem uma diferença mínima na adoção da tarifa zero. Algumas prefeituras estão alugando a frota, deixando com empresas a operação e manutenção. Outras mantêm as mesmas empresas e pagam pelo quilômetro rodado. O resultado pesa pouco nos orçamentos municipais. Porém, em Curitiba, o lucro (dos empresários) é tão extraordinário, mesmo com a perda de usuários, que preferem continuar com os subsídios”, critica. Lembrando que mesmo com uma das mais altas tarifas do país, todo ano a Prefeitura repassa milhões para os donos das empresas de transporte.
Fonte: Brasil de Fato