Ambientalistas defendem políticas públicas para prevenir tragédias e tirar população pobre das áreas de risco
Seis estados das regiões Norte e Nordeste têm famílias desabrigadas ou desalojadas pelas fortes chuvas dos últimos dias, com registros de mortes e residências arruinadas por alagamentos e deslizamentos. As áreas em estado de emergência se estendem por Acre, Amazonas, Pará, Rondônia, Tocantins e Maranhão. Segundo ambientalistas, a destruição é consequência de eventos climáticos extremos e da ocupação urbana desordenada, que empurra populações pobres para áreas de risco.
Em Manaus (AM), um deslizamento de terra no dia 12 março deixou oito mortos e atingiu 11 casas no bairro Jorge Teixeira, zona leste da cidade. Chuvas intensas voltaram a atingir a cidade neste fim de semana, e 172 famílias ficaram sem moradia, segundo a administração municipal. Entre as vítimas, moradores pobres de palafitas e casas de madeira, que ficam na rota da enxurrada e não resistem à força da água.
Um estudo recente do MapBiomas aponta que Manaus (AM) é a cidade brasileira com maior expansão de áreas urbanizadas em assentamentos precários. No período analisado, entre 1985 e 2021, a capital amazonense teve uma área equivalente a 10 mil campos de futebol ocupada por moradias inadequadas. Atrás no ranking estão São Paulo (SP), Belém (PA) e Rio de Janeiro (RJ).
“Especificamente na Rua Pingo D’agua, no Bairro Jorge Teixeira em Manaus, onde ocorreu a morte de oito pessoas devido a um deslizamento de terra, não havia registro de área de risco. No entanto, a área encontra-se dentro de um assentamento precário conhecido e delimitado pelo IBGE”, diz o estudo do MapBiomas.
No Maranhão, mais de 31 mil famílias já sofreram de forma direta ou indireta pelas tempestades. São Luís (MA) e outras 48 cidades entraram em situação de emergência, com 5,8 mil desabrigados e seis mortes em todo o estado. A capital maranhense está em sexto lugar no ranking do Mapbiomas entre as cidades com crescimento de áreas urbanizadas em assentamentos precários. Segundo o estudo, as regiões Norte, Nordeste e Sudeste concentram a maior parte das cidades com expansão de moradias em áreas de risco.
Vítimas no Acre são pessoas pobres e pretas, diz Ângela Mendes
Em Rio Branco (AC), o rio Acre e os igarapés que cortam a área urbana subiram de forma acelerada e bairros inteiros ficaram submersos. Desde quinta-feira (23) já choveu quase todo o esperado para o mês inteiro. Cerca de 32 mil pessoas foram prejudicadas, conforme a Defesa Civil.
“Muitas das famílias que perderam tudo estão em um lugar muito específico: na beira do Rio, dos igarapés e dos córregos, mas também em bairros que não têm a menor infraestrutura, nem saneamento básico”, declarou pelas redes sociais Ângela Mendes, filha de Chico Mendes e ativista socioambiental que atua na Aliança dos Povos da Floresta e no comitê que leva o nome de seu pai.
Ângela ressalta que as vítimas mais vulneráveis de Rio Branco são populações ribeirinhas e periféricas, que vivem em áreas alagáveis e têm poucas condições socioeconômicas de se reerguer após desastres naturais.
“Por isso precisamos falar sobre justiça climática. Há pessoas que têm condição de reagir a essas situações, e outras não têm. A maior parte delas tem um perfil muito específico: são pessoas pobres e pretas. E isso configura racismo ambiental”, pontua a ativista.
A pesquisa do Mapbiomas concluiu que a Amazônia lidera o percentual de crescimento das ocupações informais do território brasileiro. “Nesse bioma, 29,3% do crescimento urbano foi em áreas informais. A Região Norte possui 13 das 20 cidades com maior proporção de crescimento, com Belém entre as cinco primeiras da lista”, dizem os pesquisadores.
É preciso tomar medidas preventivas, diz Greenpeace
Como forma de se antecipar a novas tragédias, o Greenpeace defende que o governo federal faça a revisão e implementação do Plano Nacional de Adaptação (PNA), junto com o Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres.
Implementado em 2016 pelo Ministério do Meio Ambiente, o PNA tem como objetivo criar metas e estratégias governamentais para a gestão e redução de riscos que crescem devido à crise climática.
“Estamos vivenciando um aumento de eventos extremos em nosso país! É urgente que o poder público enfrente a discussão de adaptação e prevenção a catástrofes com muita seriedade. Não podemos agir somente nas ações de resposta, o problema é estrutural e a saída está em acabar com as desigualdades sociais que produzem vulnerabilidades”, diz Rodrigo Jesus, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil.
Governo estuda declarar emergência climática em mil municípios
A ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Marina Silva, visitou as áreas atingidas pelas chuvas em Manaus (AM) e disse no domingo (26) que o governo discute a edição de um decreto para reconhecer estado de emergência climática em 1.038 municípios mapeados como mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas.
O objetivo, segundo a ministra, é permitir a realização de obras preventivas, como de estudos de solo e de drenagem, além de trabalhos de assistência social que se antecipem às tragédias.
“Além da situação de emergência, são os projetos de prevenção, esses são projetos de médio e longo prazo. Nós estamos vivendo sob o efeito de mudanças climáticas que estão se agravando a cada dia”, declarou Marina Silva.
Fonte: Brasil de Fato