Mobilizações também recordam o “Massacre do Centro Cívico”
Neste 29 de abril, o Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná (APP-Sindicato) convoca, em todo estado, ato nomeado “Paz nas Escolas – Pelo fim de todas as formas de violência”. De acordo Walkiria Mazzeto, presidenta do coletivo, a manifestação tem como finalidades repudiar a crescente onda de violência nos espaços educativos de todo o país e relembrar o “Massacre do Centro Cívico”.
Neste mesmo dia, há oitos anos (2015), aproximadamente 30 mil servidores estaduais, de diferentes categorias, foram duramente repreendidos por policiais enquanto protestavam contra a aprovação da reforma do ParanáPrevidência em frente à Assembleia Legislativa. Cerca de 50 pessoas foram hospitalizadas e 213 ficaram feridas.
“Neste dia 29 de abril, nós da APP-Sindicato, faremos memória ao dia 29 de abril de 2015, quando tínhamos no Centro Cívico, também trabalhadoras e trabalhadores da Universidade Estadual de Londrina, de várias secretarias de Londrina e região, professores e funcionários de escolas reivindicando que não fosse mexido no nosso fundo de previdência. No início daquele ano, nós já tínhamos ocupado as ruas, numa grande greve que teve sucesso na retirada do projeto de lei que tramitava na Assembleia Legislativa, que destruía as nossas carreiras e conquistas históricas e ficou pendente a alteração no regime previdenciário que o governo colocou todo seu aparato policial contra nós para conseguir votar”, explica.
A liderança ressalta que desde o ataque, todo ano a data marca um dia de luta para o funcionalismo público paranaense. “De 2016 para cá, todo 29 de abril, nós fazemos memória da violência sofrida, mas também destacamos outras pautas. Este ano, nós e toda sociedade paranaense e brasileira, fomos tomados de susto e muita preocupação pelos ataques que surgiram nas escolas. No dia 20, tivemos uma grande ameaça, muitos estudantes não foram as escolas, nós trabalhadores estávamos lá, também com receio, mas não deixando de cumprir nosso papel de servidor público. Então, neste ano, estaremos nas ruas com a pauta de que nós queremos paz nas escolas”.
Mazeto refere-se a mensagens que circularam nas redes sociais na última semana indicando suposta invasão a escolas do estado. No dia de 20 abril, a ataque a escola Columbine School, nos Estados Unidos, responsável por deixar 12 mortos e 21 feridos, completou 24 anos. Em nota, a Polícia Militar do Paraná informou que as ameaças de atentado seriam notícias falsas. “Toda e qualquer denúncia é apurada e levada ao conhecimento da Polícia Civil para investigação. No entanto, até o momento, não há nenhum indício de ataques planejados em escolas do Paraná”, comunicou a corporação.
Para Márcio André Ribeiro, presidente do Núcleo Sindical de Londrina, embora as motivações para os dois episódios sejam diferentes, ambas resultaram em emprego de violência desigual contra professores e estudantes e, por isso, a entidade resolveu pela unificação das pautas.
“Infelizmente, são dois episódios que tem uma certa correlação, pois atingem com violência educadoras, educadores e alunos também. No dia 29 de abril de 2015, em Curitiba, no Centro Cívico, por ocasião de estarmos reunidos para defender direitos, fomos brutalmente repelidos pelas forças policiais, que eram em muito maior, o aparelho policial com muitas bombas, balas de borracha, foi uma reação extremamente violenta e desproporcional. Mais recentemente, desde o ano passado, mas houve uma intensificação no início deste ano, os casos de violência cometidos por seguidores do nazifascismo, grupos terroristas que vem se organizando através das redes sociais, e cometendo crimes e assassinatos dentro das escolas contra educadoras e educadores e alunos de forma geral”, assinala.
Em Curitiba, a manifestação terá início às 10h na Boca Maldita. Ao mesmo tempo, os 29 Núcleos Sindicais da APP, realizam mobilizações regionais. Em Londrina, a concentração ocorre em frente ao Banco do Brasil do Calçadão a partir das 10h. “Nós nos reuniremos no Calçadão no sábado pela manhã, montaremos uma barraca, onde receberemos as pessoas para divulgar vídeos do 29 de abril, para rememorar este dia que não pode ser esquecido. Panfletos também serão distribuídos à população para dialogar, explicar sobre estes lamentáveis fatos ocorridos para evitar que eles voltem a acontecer mais uma vez”, conta Ribeiro.
Justiça tem lado
Em setembro de 2015, o Ministério Público moveu a ação contra o então governador, Beto Richa (PSDB), o deputado estadual Fernando Francischini – na época secretário de Segurança Público – e outros quatro comandantes da Polícia Militar por improbidade administrativa. Mas, em 2017, a Justiça do Paraná, através da decisão da juíza Patrícia de Almeida Gomes Bergonse, optou por inocentar os acusados. Ribeiro lamenta a escolha do poder Judiciário e salienta a parcialidade da sentença.
“Mais de 200 pessoas feridas, muitas de Londrina estavam lá, inclusive, eu. Se a Justiça inocentou o governador à época, mas alguém teria que ser responsabilizado pela diferença de ação, pois foi um ato desproporcional. Estávamos em um grande número de pessoas, mas não havia ninguém armado com absolutamente nada. Estávamos com as mãos vazias, limpas, nem pedra sequer, tínhamos para dizer que poderíamos agredir alguém. Então, a força empregada foi absolutamente desigual, então, alguém deveria ser responsabilizado por isso, mas infelizmente nos parece que a Justiça paranaense tem o seu lado”, avalia.
“Paz sem voz, é medo”
Segundo levantamento realizado pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), no Brasil, o primeiro caso de ataque à escola causado por alunos ou egressos ocorreu em 2002. Desde então, já foram contabilizados 22 ocorrências, sendo que mais da metade (13 casos) aconteceram nos últimos dois anos. O mapeamento considera somente violências planejadas e, portanto, o número pode ser ainda maior.
Mazeto observa que durante todo o ano, a APP-Sindicato realizará ações para promover a paz não apenas nos ambientes escolares, mas em toda a sociedade, visto que compartilha do entendimento de que aumento da violência nos colégios é reflexo do acirramento das desigualdades sociais e intolerância em todos os espaços. Estudiosos da educação têm relacionado os ataques às escolas ao compartilhamento de discursos de ódio ecoados por segmentos da extrema-direita que têm chego ao poder, inclusive, no Brasil, a exemplo da eleição de Jair Bolsonaro (PL) em 2018.
“O fim da violência em todas as suas formas, contra nós, as escolas e a sociedade paranaense. Provavelmente, ao longo do ano, continuaremos propondo este debate sobre qual paz e escola queremos. Uma escola e sociedade que respeitam as diferenças. Não é tranquilo para uma criança em idade escolar, que ainda está se constituindo como ser humano, e porque é negra, nipônica, indígena, muito alta, muito baixa, muito magra ou obesa, porque tem sardas, porque é LGBT, por orientação sexual, ser alvo de provocações, piadas, comportamentos agressivos. Isto que tem sido chamado de ‘bullying’, é violência. Isto precisa ser debatido na escola e para além dos muros da escola”, afirma.
Neste sentido, a educadora ressalva a importância das instituições escolares estimularem discussões que pautam o reconhecimento às diversidades. Os debates, que envolvem direitos humanos, apesar de constituírem conteúdos curriculares de disciplinas, como Sociologia, têm sido alvo de disputas por grupos conservadores que têm tentado cercear os assuntos de sala de aula e criminalizado docentes que buscam abordá-los.
“Contrário a dizer de que nós na escola fazemos doutrinação, lavagem cerebral, definição sexual das crianças, muito pelo contrário, o debate precisa ser de entender que nossa sociedade é diversa, principalmente, no quesito racial. Precisamos compreender que nossa riqueza está na nossa diferença e ela precisa ser respeitada. Quando a gente passar a ter respeito pelo outro como ele é, da forma como é, da cor que é, da orientação sexual que tem, com certeza, nós teremos uma sociedade com diferenças, mas com paz, para que nossas crianças tenham tranquilidade para frequentar as escolas ou qualquer outro espaço”, indica.
Policiais somente fora do muro da escola
Após ataques mais recentes, em São Paulo e Santa Catarina, o governador Ratinho Júnior (PSD) anunciou, no último dia 13 de abril, um conjunto de medidas para aumentar a segurança nas escolas paranaenses. Entre as medidas, o chefe do Palácio do Iguaçu determinou a contratação de mais 2 mil policiais para fazer rondas em frente às escolas e também estarão dentro das unidades. Ainda, informou que ampliará de 204 para 400 o número de colégios cívico-militares no estado.
As iniciativas têm sido criticadas por educadores que não a consideram efetivas, conforme aponta Ribeiro: “A APP Sindicato sempre defendeu e continuará sendo assim que a escola é um lugar de educação, de educadores e educandos. Um local de aprendizagem, socialização, não é um local de polícia armada, mas defendemos isso sim, para toda a sociedade, que essa fiscalização aconteça no entorno da escola. Penso que as forças policiais já estão fazendo o seu papel de forma muito bem feita, fica aqui o nosso reconhecimento em relação a isso. O trabalho de inteligência e investigação desmantelando destas células terroristas é o principal papel da polícia, além das policiais ostensivas que devem completar este trabalho, dissuadindo as pessoas que eventualmente pensam em fazer algo neste sentido. Policiais trabalhando junto com a comunidade escolar, mas sempre fora dos muros da escola”, finaliza.
A APP-Sindicato disponibilizou modelos de cartazes e faixas com o slogan “Paz nas escolas” para os manifestantes. Os materiais podem ser conferidos aqui. O coletivo também solicita que os participantes utilizem a hashtag #PazNasEscolas a fim de aumentar a visibilidade para o ato.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.