Professores e funcionários seguem jornada em defesa da escola pública no estado
Após três dias de intensa mobilização em todo Paraná, professores e funcionários de escola da rede estadual de ensino decidiram suspender a paralisação, permanecendo em estado de greve, o que significa que a qualquer momento a interrupção das aulas poderá ser retomada.
A decisão foi tomada pelos trabalhadores em assembleia remota realizada na tarde desta quarta-feira (5). A reunião contou com grande participação, aproximadamente 5 mil educadores, o que representa 63% da categoria.
Os profissionais da educação básica deflagraram greve na última segunda-feira (3) com o intuito de tentar barrar a aprovação de projeto de lei responsável por instituir o programa “Parceiro da Escola”. A medida, proposta pelo governador Ratinho Júnior (PSD), autoriza que a administração de escolas estaduais seja repassada para iniciativa privada.
Sob protestos, recorrendo a assédios, tentativas de criminalização do movimento e violência, conforme denunciado pela APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná), o projeto foi aprovado nesta terça-feira (4), em segundo turno, com 38 votos a favor e 13 contra. No mesmo dia, o mandatário do Palácio do Iguaçu sancionou a iniciativa.
De acordo com o texto, já a partir de 2025, a gestão de 204 colégios públicos, pouco mais de 10% da rede estadual de ensino, será terceirizada. A estimativa é que pelo menos R$ 140,5 milhões mensais, chegando a R$ 1,7 bilhão por ano, sairão dos cofres públicos para as empresas particulares, que assumirem serviços de limpeza, segurança, merenda, contratação de docentes e demais funcionários.
Walkiria Mazeto, presidenta da APP-Sindicato, avalia que a manifestação foi extremamente importante para discutir junto à população as consequências do programa que negligencia o dever do estado de ofertar educação gratuita e de qualidade de maneira universal.
“O projeto foi aprovado, mas nós conseguimos colocar o debate sobre o perigo deste programa em todo estado, fora dele e, inclusive, fora do Brasil. Nós tivemos uma denúncia em uma reunião da OIT [Organização Internacional do Trabalho], em Genebra, onde várias das centrais sindicais se pronunciaram. Cumpre um papel importante o nosso movimento de fazer a denúncia, alertar a população”, indica.
A liderança se refere a denúncia da gestão Ratinho Júnior por “prática antissindical” à Organização Internacional do Trabalho, agência multilateral da ONU (Organização das Nações Unidas), especializada nas questões do trabalho, especialmente, no que se refere ao cumprimento das normas.
Conforme anunciado pelo Portal Verdade, o governador através da PGE (Procuradoria Geral do Estado) estabeleceu multa diária de R$ 100 mil à APP-Sindicato e pediu a prisão da presidenta da entidade (veja aqui).
Ainda, Mazeto, pontua que a partir de agora, o trabalho do coletivo é intensificar a discussão sobre os impactos do programa com as comunidades escolares e a sociedade em geral.
Entre as consequências, os educadores alertam para intensificação da precarização do trabalho via aumento das contratações terceirizadas, uma vez que, a medida dispensa a realização de concursos públicos, demissões em massa, instauração de metas abusivas levando ao adoecimento ainda maior dos trabalhadores, interferência no processo pedagógico e perda da autonomia docente, falta de assistência aos estudantes com deficiência, ampliação das desigualdades socioeducacionais, adoção de mensalidades, entre outras.
“Vamos fazer a manutenção do diálogo com a comunidade escolar e comunidade em geral da necessidade de defender os serviços públicos, no nosso caso a educação pública, e não permitir que caso a SEED [Secretaria Estadual de Educação] chegue fazer a consulta para ver se as escolas querem aderir ou não ao programa, que a resposta seja ‘não’, que a escola continue sendo pública e não permitam que o dinheiro dos nosso impostos, dinheiro público ao invés de ser investido nas escolas vire lucro no bolso de algum empresário que já é rico”, diz.
Em entrevista ao Portal G1, nesta terça-feira, o secretário de Educação, Roni Miranda, disse que as consultas públicas que podem definir a implantação da terceirização nos colégios estaduais devem começar em 20 de outubro e seguir até novembro deste ano.
Inconstitucionalidade e sem direito à reposição
Ainda, de acordo com Mazeto, a APP-Sindicato irá procurar as instâncias jurídicas para contestar a legalidade do programa. “Diante da aprovação do projeto que já está até sancionado e já é lei, nós vamos também buscar a via judicial para questionar a legalidade, temos diversos elementos que avaliamos que caracterizam este projeto como ilegal e inconstitucional”, acrescenta.
Uma das principais queixas dos estudantes e professores é a falta de diálogo por parte da SEED. Inclusive, a votação, em primeiro turno, foi realizada em sessão online, impossibilitando a participação popular (relembre aqui).
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) de 1996 assegura a gestão democrática da educação, isto quer dizer que, todos os atores da comunidade escolar – professores, gestores, funcionários, pais, estudantes – podem participar ativamente das decisões da escola.
Ainda, segundo Mazeto, a pasta não tem aceitado negociar junto a APP e movimento estudantil, a reposição das atividades referentes aos três dias de suspensão das atividades. A entidade, acompanhada de outras associações que representam pais, mães e demais responsáveis bem como de lideranças estudantis, permanecem tentando mediar junto a SEED para que os alunos não tenham o direito à reposição dos conteúdos lesado.
Já acerca dos servidores, o MPT (Ministério Público do Trabalho) convocou o governo do Paraná para uma audiência com a APP-Sindicato na próxima segunda-feira (10), às 14h, para estabelecer uma mesa de negociações relacionadas à greve dos professores do estado. Entre os encaminhamentos, serão debatidos caminhos para evitar punições aos professores que aderiram à paralisação como a representação por faltas.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.