Documento será levado ao Ministério Público do Trabalho
A APP-Sindicato (Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do Paraná) – Núcleo Londrina está produzindo dossiê, no qual demonstra uma série de ilegalidades constatadas durante as reuniões promovidas pela SEED (Secretaria Estadual de Educação) em parceria com o NRE (Núcleo Regional de Educação) a fim da divulgação do programa “Parceiro da Escola”.
Proibição da participação de dirigentes sindicais, lideranças comunitárias e estudantes, negação do direito ao contraditório e uso da fala nas reuniões, ausência de transparência e publicidade sobre o dia e pauta das reuniões foram algumas das ilegalidades verificadas.
Segundo Rogério Nunes da Silva, professor da rede estadual e secretário de Assuntos Jurídicos da APP-Sindicato Londrina, o documento tem as finalidades de chamar a atenção dos paranaenses para as arbitrariedades e, ainda, subsidiar ações jurídicas com o apoio de outras entidades que atuam na defesa da educação pública.
“Nós estamos no processo do debate em defesa da escola pública, do direito à educação dos estudantes e das comunidades e de combate ao processo de privatização que tem sido implementado pelo governo Ratinho Júnior”, afirma.
Conforme apontado pelo Portal Verdade, entre os dias 21 e 24 de outubro, representantes da Secretaria Estadual de Educação e do Núcleo Regional de Educação visitaram as setes escolas selecionadas em Londrina e cidades vizinhas (veja listagem abaixo) para apresentar aos pais e demais responsáveis supostos benefícios do projeto, responsável por repassar para a iniciativa privada a gestão de pelo menos 204 escolas estaduais.
Professores e funcionários de escola vinculados à APP-Sindicato compareceram aos colégios com o intuito de retirar dúvidas bem como estabelecer um contraponto, sinalizando para a equipe de Ratinho Júnior (PSD) e aos pais, as suas preocupações com o programa que, no entendimento do coletivo, significa a venda das escolas públicas no Paraná.
No entanto, os trabalhadores foram proibidos de entrar na maioria das escolas, a exemplo do Colégio Estadual Dom Geraldo Fernandes, em Cambé, região metropolitana de Londrina, em que a porta chegou a ser trancada para inviabilizar a presença dos docentes e da imprensa (saiba mais aqui).
Em outros casos, como no Colégio Estadual Jardim San Rafael, localizado em Ibiporã, também na região metropolitana de Londrina, apesar de terem acesso à escola, os professores foram impedidos de questionar a SEED sobre a privatização (veja aqui).
Rogério classifica o balanço das reuniões como preocupante e lembra que os abusos envolvendo a implementação do programa “Parceiro da Escola” iniciaram já durante a greve deflagrada pelos educadores em junho deste ano.
A mobilização tentou impedir a aprovação do programa e foi marcada por uma série de assédios e práticas antissindicais como atribuição de descontos indevidos aos servidores que aderiram à paralisação, aplicação de multa, chegando ao pedido de prisão da presidenta da APP, professora Walkiria Mazeto (relembre aqui).
“Infelizmente, esses abusos que se iniciaram no processo de greve, eles tendem a permanecer sendo realizados pela Secretaria Estadual de Educação, pelas chefias dos Núcleos Regionais de Educação e por algumas direções escolares”, observa.
“Reuniões pro forma”
De acordo com Decreto 7.235/24, publicado em setembro pela SEED, a implementação do programa “Parceiro da Escola” nas instituições de ensino da rede estadual está condicionada ao desenvolvimento de “reuniões com a comunidade escolar e a divulgação da consulta pública em todas as instituições”.
Poderão participar da consulta pública, prevista para a segunda quinzena de novembro, professores e funcionários que estejam alocados na instituição de ensino, exceto terceirizados, também responsáveis, perante a escola, pelo aluno menor de 18 anos e estudantes com 18 completos até a data da consulta.
Ainda, com base na normativa, nas escolas em que o quórum não for atingido, “será vedada a divulgação do conteúdo das urnas” e, portanto, o programa será implementado compulsoriamente pela SEED.
Porém, Rogério ressalva, que as reuniões foram organizadas de modo a não garantir a participação da grande parte dos pais e dos estudantes, mesmo daqueles que têm direito ao voto.
“Em várias escolas, as reuniões foram realizadas sem publicidade, ou seja, a prática comum na escola é realizar um bilhete, colocar um edital, convocar a comunidade escolar para debater aquele tema. Parte das escolas não fizeram isso, pelo contrário, induziram os pais convocando para uma reunião pedagógica de entrega de boletins”, adverte.
Conforme noticiado pelo Portal Verdade, no Colégio Estadual Nossa Senhora de Lourdes, localizado na zona Leste de Londrina, pais foram convocados para “entrega de boletins”, mas se deparam com reunião para propagandear o programa “Parceiro da Escola”. Além disso, a SEED extrapolou o tempo previsto para apresentação, impossibilitando que houvesse um momento para questionamentos.
“Em algumas escolas, cito duas específicas, no Nossa Senhora de Lourdes e no Ubedulha, as reuniões foram realizadas no período da manhã, às 7h30, inviabilizando a participação dos responsáveis, trabalhadores e trabalhadoras que, essa hora, já estão se deslocando para o trabalho, e no caso específico do Ubedulha, inviabilizando a participação de uma grande parte dos alunos do ensino médio que estão matriculados ainda no período noturno”, complementa o docente.
No Colégio Estadual Professora Ubedulha Correia de Oliveira, no Conjunto Luís de Sá, zona Norte de Londrina, lideranças de movimentos sociais também foram impedidos de ingressar na escola sob a justificativa que estariam sendo “manipulados” pela APP-Sindicato.
Ainda, no Colégio Estadual Professora Cleia Godoy Fabrini da Silva, na zona Sul da cidade, membros do Núcleo Regional de Educação alegaram que a reunião seria restrita aos pais de estudantes matriculados no Colégio, impossibilitando a presença de moradores e diretores da APP-Sindicato.
“Apesar da legislação assegurar os princípios da gestão democrática e da participação da comunidade, as reuniões foram realizadas apenas pro forma. Nesse sentido, elas pouco serviram para esclarecer os principais interessados que são os estudantes e os seus responsáveis sobre os possíveis impactos do processo de privatização”, avalia Rogério.
A Fepamef-PR (Federação das Associações de Pais, Mestres e Funcionários das Escolas Públicas do Estado do Paraná) declarou, através de nota, a contrariedade à implementação do programa “Parceiro da Escola”. Em entrevista ao Portal Verdade, Paulo Cesar Ferreira, presidente da entidade, relatou que a Federação também tem sido impedida de participar das reuniões convocadas pela SEED e Núcleo Regionais de Educação em diversas cidades.
Apesar das tentativas de cerceamento do diálogo, Rogério avalia que a panfletagem e conversas com os pais nas portas das escolas, ações que integram a campanha “Não venda minha escola”, lançada pela APP-Sindicato em julho, durante o 14º Congresso Estadual, tem sido fundamentais para alertar sobre os prejuízos do programa que incluem, segundo especialistas, ausência de atendimento especializado para estudantes com deficiência, precarização da carreira docente, fechamento de turmas do ensino noturno, entre outros.
“Embora o discurso do governador Ratinho Júnior, indique para democracia no processo, ele tem sido realizado num atropelo e sem a possibilidade que os pais e os estudantes tivessem acesso ao conteúdo do projeto. As reuniões transpareceram essa postura autoritária e foram também uma oportunidade para que a gente dialogasse, mesmo não participando das reuniões com as comunidades escolares, mas por meio da panfletagem e do diálogo em loco nas escolas”, analisa.
Denúncias
Ainda, de acordo com o professor Rogério, denúncias de irregularidades e abusos identificados durante a divulgação do programa devem ser encaminhadas ao Núcleo Sindical da APP-Londrina através do e-mail: applondrina@yahoo.com.br
É fundamental que as queixas estejam acompanhadas de fotos, vídeos, entre outras evidências. “É importante que reúna essa documentação e mande para nós, pode ser pessoas do estado como um todo”, explica.
A liderança reforça que será garantido sigilo. “O que a gente precisa é da documentação e da materialização dessas ilegalidades”, assinala.
Confira as sete escolas selecionadas em Londrina e região:
- Colégio Estadual Professora Cleia Godoy Fabrini da Silva
- Escola Estadual Professora Kazuco Ohara
- Escola Estadual Nossa Senhora de Lourdes
- Colégio Estadual Doutor Willie Davids
- Colégio Estadual Professora Ubedulha Correia de Oliveira
- Colégio Estadual Jardim San Rafael (Ibiporã)
- Colégio Estadual Dom Geraldo Fernandes (Cambé)
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.