Na liderança das pastas da Cultura e Procuradoria-Geral do Estado, mulheres ocupam somente 5% das cadeiras no primeiro escalão do governo até agora
No último domingo (1º), Ratinho Júnior (PSD) assumiu seu novo mandato como governador do Paraná. A primeira gestão do mandatário, reeleito com 4.243.292 votos, foi marcada por tentativas de privatização do patrimônio público e sucateamento de serviços e direitos da população, a exemplo da venda da Companhia Paranaense de Energia (COPEL) e concessão da administração dos hospitais universitários também para iniciativa privada (Projeto de Lei nº 522/2022).
Todas as ofensivas foram acompanhadas de protestos do funcionalismo público – que enfrenta defasagem salarial de 37%, considerando também as perdas acumuladas durante a gestão de Beto Richa – e de demais setores da sociedade paranaense que tomaram as ruas para denunciar os retrocessos como a mobilização convocada por estudantes secundaristas contra a terceirização de 27 escolas públicas no estado através do programa “Parceiro da Escola”. Após intensa articulação, apenas dois colégios aprovaram a iniciativa.
Contudo, o segundo governo do chefe do Executivo já em curso não demonstra que seguirá rumos diferentes. Em discurso de posse na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP), Ratinho Júnior enalteceu ações realizadas nos últimos quatro anos e anunciou novas medidas como a criação da Secretaria da “Mulher e Igualdade Racial”. O órgão ainda não tem responsável definido.
Embora a pasta indique uma tentativa de aceno às mulheres que representam a maioria do eleitorado paranaense, segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), elas contabilizaram 53% dos votantes nas eleições de 2022, a presença feminina no primeiro escalão do governo ainda é muito pequena.
Até esta quinta-feira (6), dos 34 nomes anunciados para comandar as secretarias e estatais, apenas duas são mulheres: Luciana Casagrande Pereira, na Cultura e Leticia Ferreira da Silva, na Procuradoria-Geral do Estado. Isto quer dizer, que elas ocupam somente 5% das cadeiras enquanto homens representam 95%.
Para Camila Monteiro, cientista política, a ausência de mais mulheres na composição do governo de Ratinho Júnior reforça a necessidade das lutas para que a equidade de gênero seja alcançada também na política, rompendo com visões estereotipadas, baseadas na divisão sexual do trabalho, responsáveis por condicionar mulheres ao ambiente doméstico.
“Estamos avançando nas discussões, mas ainda é difícil encontrar mulheres em postos de liderança, comandando grandes equipes, desempenhando papeis de prestígio. É mais frequente que elas ocupem espaços secundários, assessorando, o que não é um problema, mas torna-se na medida em que não lhe são dadas as oportunidades para estarem em cargos mais altos, reforçando o papel da mulher como submissa, coadjuvante ao homem que assume o protagonismo. Outra dificuldade é a visão muito difundida de que mulheres não estariam aptas para liderar”, observa.
Confira a listagem dos secretários anunciados por Ratinho Júnior até o momento:
Casa Civil: João Carlos Ortega
Chefe de Gabinete: Darlan Scalco
Copel: Daniel Slaviero
Sanepar: Claudio Stabile
Compagas: Rafael Lamastra
Cohapar: Jorge Lange
Desenvolvimento Social e Família: Rogério Carboni
Desenvolvimento Sustentável: Valdemar Bernardo Jorge
Administração e Previdência: Elisandro Pires Frigo
Agricultura e Abastecimento: Norberto Ortigara
Casa Militar: Sérgio Vieira Benício
Cidades: Eduardo Pimentel
Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: Aldo Bona
Cultura: Luciana Casagrande Pereira
Educação: Roni Miranda
Esporte: Helio Wirbiski
Fazenda: Renê Garcia
Indústria, Comércio e Serviços: Ricardo Barros
Inovação, Modernização e Transformação Digital: Marcelo Rangel
Planejamento: Guto Silva
Saúde: Beto Preto
Segurança Pública: Hudson Leôncio Teixeira
Controladoria-Geral do Estado: Raul Siqueira
Procuradoria-Geral do Estado: Leticia Ferreira da Silva
Mais mulheres na ALEP e Congresso Nacional, mas ainda minoria
No último pleito, o Paraná registrou recorde de candidaturas de mulheres face as últimas eleições nacionais. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), das 1.560 candidaturas cadastradas no estado, 521 foram de mulheres, atingindo 33%. Com isto, a presença de mulheres na ALEP também cresceu. Dos 54 parlamentares eleitos em 2022, dez são mulheres. Porém, a representação feminina no poder Legislativo ainda é de apenas 18%.
“Desde o final dos anos 2000, algumas legislações buscam incentivar o ingresso de mais mulheres na política, a exemplo da Lei nº 12.034, que estabelece que cada partido deve apresentar percentual mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”, explica Monteiro.
De acordo com a pesquisadora, é preciso garantir a diversidade entre as mulheres que compõem os governos, visto que na maioria das vezes, segmentos mais subalternizados como mulheres negras, trans, tendem a ser ainda mais excluídas. No último pleito, a bancada feminina na Câmara dos Deputados saltou de 77 para 91 membras. Assim, mulheres passam a representar 17% das cadeiras. Até 2022, a representação era de 15%. Também primeira vez na história, duas deputadas trans chegam à Câmara dos Deputados: Erika Hilton (PSOL) e Duda Salabert (PDT).
“É fundamental desenvolvermos um olhar interseccional, atento às múltiplas desigualdades. Em 2022, mulheres negras representam apenas 2% do Congresso Nacional enquanto somavam 27% da população. É mais do que representatividade, é a urgente necessidade que as demandas, reinvindicações deste segmento estejam pautadas para criação de políticas públicas”, adverte Monteiro.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.