É a primeira vez que o Censo Escolar reúne informações sobre os tipos de contratação dos docentes
Levantamento divulgado pelo MEC (Ministério da Educação), em 22 de fevereiro último, indica que mais da metade dos professores que atuam nas escolas estaduais do Brasil é contratada de forma temporária, ou seja, sem acesso a direitos trabalhistas como férias, licença remunerada, 13º salário.
Os dados partem do Censo Escolar 2023. Trata-se de uma pesquisa que tem como finalidade principal oferecer um diagnóstico sobre a educação básica. Coordenado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), o estudo é realizado em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios.
De acordo com o mapeamento, o país tem 690.406 docentes ativos nas redes estaduais de ensino, sendo que 51,6% deles são admitidos por tempo determinado. Já os professores efetivos, admitidos por concurso, representam 46,5% do total.
As redes estaduais são responsáveis por 30% das matrículas da educação básica do país. No ensino médio, elas concentram 83,6% dos estudantes.
Das 27 unidades da federação, 15 já trabalha com mais educadores temporários do que efetivos. Minas Gerais é o estado com o menor percentual de docentes concursados, apenas 19,2%. Tocantins, Acre, Espírito Santo, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul também contam com menos de um terço dos professores contratados de forma efetiva.
Em dezembro de 2023, a SEED (Secretaria Estadual de Educação) prorrogou por mais um ano, o contrato de 31.995 professores temporários no Paraná. Conforme relatado pelo Portal Verdade, o último concurso, realizado no ano passado e após 10 anos do certame anterior, estabeleceu a contratação de 1,2 mil vagas entre docentes e pedagogos. O quantitativo é muito inferior ao número de contratos emergenciais em andamento no estado (relembre aqui).
Os prazos dos vínculos variam. Há estados que estipulam prazo de um ano e outros que chegam a três anos.
Jaqueline Segato, pedagoga, estudiosa das condições de trabalho docente, destaca que as contratações temporárias são permitidas pelas legislações, porém devem ser realizadas em casos esporádicos, quando profissionais estáveis tiverem de se afastar por problemas de saúde ou para assumir outros funções na área.
“É uma solução para momentos específicos e não deve se tornar a regra. Professores temporários enfrentam uma realidade ainda mais precária. Além da falta de estabilidade, estes docentes não são contemplados por outras garantias como licenças médicas, férias, não são incluídos nos planos de carreira dos estados. É uma forma de admissão mais barata que desvaloriza cada vez mais a profissão e leva ao apagão docente no país”, alerta.
A expressão “apagão docente” tem sido utilizada para apontar a iminente falta de professores para atendimento da demanda por escolarização básica em um futuro próximo. Baixos salários, falta de reconhecimento e aumento da violência nos ambientes escolares têm afastado as novas gerações da carreira. Levantamento do Portal G1, divulgado na última semana, identificou que o interesse em cursos de licenciatura caiu 74% nos últimos seis anos nas universidades públicas do Paraná.
A pesquisadora também chama atenção para os reflexos no ensino aprendizagem. A alta rotatividade dificulta o planejamento dos professores e traz insegurança também aos estudantes que não sabem se terão as aulas e por quem elas serão ministradas.
“A elaboração de um plano de ensino fica muito comprometida com a falta de constância. A previsibilidade é um elemento crucial no processo educativo. Com a mudança constante, tanto os trabalhadores da educação como os estudantes torna-se mais difícil a criação de vínculos entre a comunidade escolar e diversos estudos apontam o quanto este reconhecimento é importante para que a educação faça sentido e a aprendizagem efetivamente aconteça”, adverte.
“É preciso ter uma maior regulamentação e fiscalização destes contratos. Estes professores são fundamentais para que o sistema educacional não colapse, e precisam ser reconhecidos. Além disso, é necessário que mais concursos públicos sejam realizados pelas secretarias”, acrescenta.
Franciele Rodrigues
Jornalista e cientista social. Atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Tem desenvolvido pesquisas sobre gênero, religião e pensamento decolonial. É uma das criadoras do "O que elas pensam?", um podcast sobre política na perspectiva de mulheres.